A genialidade e inteligência de Steven Wilson é já inigualável, o músico tornou-se uma lenda em pouco tempo, e já desde os tempos dos Porcupine Tree, Wilson destacou-se como um dos músicos mais geniais da sua geração e é, sem dificuldade, um dos melhores de sempre. Portanto, não fiquei surpreendido quando soube o conceito do seu mais recente disco, Hand. Cannot. Erase., que apesar de não conter a magia de Insurgentes ou Grace For Drowning, o novo lançamento contém um dos mais cruéis e agressivos conceitos que alguma vez ouvi.
Apesar de instrumentalmente ser impecável, os álbuns anteriores são bem mais geniais nesse campo, Hand. Cannot. Erase., tem a estranha capacidade de marcar pelo seu conceito que está repleto de emoção, desgosto, tristeza e ainda sentimentos de abandono e, por vezes, esperança. O conceito do disco é, largamente, inspirado na história de Joyce Vincent, uma mulher que morreu em fins de 2003, mas o seu corpo só foi descoberto em inícios de 2006 já que ninguém deu conta que ela estava morta. Joyce era uma mulher que tinha amigos, família, emprego e uma vida que valia a pena viver. No entanto, em 2001, ela despediu-se do seu emprego e mudou-se para um refúgio que defendia mulheres abusadas e que foram vítimas de abusos. Nessa altura, começou a afastar-se de todos os seus amigos, família e foi cortando contacto com o mundo real. A razão para a sua morte é ainda desconhecida. Os cheiros e sons não levantaram suspeitas, os cheiros eram atribuídos aos caixotes do lixo e os sons da televisão atribuídos a uma vizinhança barulhenta. De mencionar, que quando descoberta luz, água e aquecimento ainda funcionavam, pois eram pagos de forma automática via débito. Apesar de o som da televisão ser constante, nem isso alertou que algo podia ter acontecido. Ninguém deu conta da sua morte, porque ninguém sentiu a sua falta.
O sentimento de todo o álbum resume-se na última frase do parágrafo anterior, e foi aí que Steven Wilson inspirou a sua obra que conceptualmente roça o estatuto de obra-prima. Instrumentalmente, consegue ter momentos geniais que, equiparados com o nível de produção e de estrutura do álbum, fazem uma base fortíssima para crer que este disco pode se tornar num dos dez melhores lançamentos do ano. As faixas “3 Years Older”, “Routine”, “Regret #9”, “Ancestral” e “Happy Returns” são as grandes músicas de um disco que se complementa pelo seu conceito. Ainda assim, gostaria de apontar essas cinco faixas. “Ancestral” é, provavelmente, uma das faixas mais doentias e fantásticas que ouvi nos últimos anos, e o solo em “Regret #9” é, totalmente, perturbador e doentio de tão bom que é.
Apesar de não conter a magia de Insurgentes, magnífico álbum e o melhor da sua discografia a solo, este mais recente disco tem verdadeiros momentos de espectacularidade e magnificência. A suavidade e candura de “Happy Returns” e “Ascendant Here On…” completam um álbum perfeito para o conceito a que se propõe. Como todo o álbum conceptual, a estrutura é parte vital e essencial de um lançamento que deve ser, não só um álbum de música como uma composição narrativa de excelência. Este caso não é excepção. Steven Wilson tem aqui um trabalho narrativo magistral e que roça a obra-prima. Não sou de dar notas perfeitas, mas no que respeita a estrutura e conceito, este disco, nesse aspecto, com certeza que o obtém.
Hand. Cannot. Erase. é um trabalho bem pensado e muito emocional. Não quero especificar em demasia certas faixas, apesar de já o ter feito, pois é uma composição que merece audições sucessivas e em grande número e que merece ser ouvido num todo. O Rei do rock progressivo pode adicionar mais outra conquista à sua longa lista de conquistas com este seu novo lançamento, que não só é complexo como corajoso, genial e muito emocional.
Autor: João Braga
Álbum. Kscope. 27/02/2015
Classificação/Rating
8.5
Tem um dos conceitos mais cruéis e complexos da discografia de Steven Wilson, que apresenta um dos melhores dez discos do ano, com certeza.