O post-rock instrumental é um género que tem crescido imenso durante esta década passada. Desde o momento que bandas como Explosions in the Sky e Godspeed You! Black Emperor molharam o pé na cena musical, outras bandas começaram a emergir com um interesse em criar atmosferas cinemáticas através da música, tendo muitas delas surgido nesta década que passou. Embora não se considerem como uma banda de post-rock, os Russian Circles são jogadores incontestáveis no género e álbuns como Station e Memorial são prova disso, tendo ajuda a cimentar o caminho para uma nova era de bandas dedicadas à música instrumental que têm cada vez mais marcado presença em grandes festivais e por esse mundo fora.
No ano passado, o trio composto pelo baixista Brian Cook, o guitarrista Mike Sullivan e o baterista Dave Turncrantz lançara Blood Year, o seu sétimo longa-duração, que tem vindo a ser descrito como um álbum mais linear e mais pesado que os seus antecessores. Falamos recentemente com Brian acerca deste mesmo lançamento, assim como a sua opinião em relação à cena post-rock, a sua próxima digressão Europeia com Torche e subsequente regresso a Portugal. Dêem uma espreitadela.
Olá! Antes de mais, com quem temos o prazer de estar a falar e como vão as coisas com os Russian Circles?
Brian Cook, toco baixo, Moog Taurus e um pouco de guitarra barítono na banda.
Vocês têm um novo álbum, Blood Year, editado no ano passado. Em comparação com os vossos trabalhos anteriores, como abordaram novo álbum de um ponto de vista criativo?
Nós acabamos por andar em digressão com o álbum anterior por um tempo maior do que aquele que antecipávamos. Eu acho que isso mudou o nosso modo pensamento de “somos uma banda que grava álbuns” para “somos uma banda que vive na estrada” e isso mudou a maneira como abordamos a escrita. Não queríamos criar um álbum exuberante e complexo como fizemos no passado pois não é representativo do material para o qual gravitamos perante um cenário ao vivo. Queríamos fazer um álbum que reflectisse a intensidade dos nossos concertos, portanto fizemos deliberadamente um álbum mais desnudado e directo.
Tal como o vosso álbum anterior, Guidance, este novo álbum fora gravado mais uma vez por Kurt Ballou. Como foi trabalhar novamente com ele? O que achas que ele traz de novo no que toca a gravação e produção?
Nós gostamos de trabalhar com o Kurt, é uma boa companhia. E ele é um génio no estúdio. No fim de contas, gostamos do equilíbrio específico que ele tem entre a captura da energia ao vivo e a utilização do estúdio para realçar a gravação. Eu quero que os nossos álbuns sejam uma representação honesta do nosso som mas também queremos fazer alguns enfeites e o Kurt está na mesma onda no que toca a acertar nesse equilíbrio.
A capa do Blood Year fora criada pelo Orion Landau. Tendo no passado utilizado fotografias como capas, o que vos fez mudar a vossa abordagem?
Acho que foi mais uma reacção em relação ao nosso álbum anterior, Guidance. Esse álbum utiliza fotos de execuções públicas na China durante o inicio do século XX que alguém ofereceu ao meu marido e todos ficamos intrigados com as mesmas porque não havia qualquer contexto ou história por detrás delas, apenas estas imagens fortes e trágicas de um tempo e lugar distantes. Mas mesmo depois de termos cortado as fotos para eliminar as imagens violentas, após um tempo começou a ficar parecido com aqueles velhos álbuns de crust punk que tinham fotos de guerra brutais como capa. É como estar a pegar na miséria de outras pessoas e reutilizar como arte. Sinto-me estranho em relação a isso, talvez todos nos tenhamos sentido. Então, todos estávamos dispostos a ir com algo mais abstracto, algo mais focado em design. Nós amámos o que o Orion fez com o álbum Only Ghosts dos Red Fang, então contactámo-lo e ele acertou na primeira tentativa.
Quão importante é para ti criar uma conexão entre a capa, os desenhos e a música durante a construção de um novo álbum?
Bem, nenhum de nós é especialista em design gráfico. Eu formei-me em artes plásticas na faculdade, portanto a componente visual é importante para mim, mas não sou bom a aplicar essas habilidades na criação de um pacote. Todos nós valorizamos uma certa quantidade de ambiguidade nas nossas capas, mas decidir entre um design que transmita uma emoção sem forçar a ideia na tua cabeça pode ser um desafio.
Ao longo dos anos, os Russian Circles gravaram com vários músicos, entre eles a Chelsea Wolfe, que cantou na assustadoramente bela faixa-titulo de Memorial. Como foi gravar essa música com ela?
Não há muito a dizer. Nós estivemos em digressão com a Chelsea um ou dois anos antes e falamos em colaborar de alguma maneira. O Mike escreveu a música com ela em mente, enviamos-lhe um ficheiro e um dia depois, ela tinha as partes dela todas escritas e gravadas. Foi uma colaboração muito tranquila. Estilisticamente, somos artistas diferentes em várias maneiras, mas ambos tentamos transmitir o mesmo tipo de emoções.
Existem mais alguns artistas com quem gostariam de colaborar no futuro?
Eu gosto de colaborações mas temos de estar cientes de que o mais provável é não podermos tocar quaisquer umas dessas músicas ao vivo e, tendo em conta que somos uma banda de digressões, não nos faz muito sentido dedicar tempo e energia a criar música que não podemos tocar ao vivo. Honestamente, não há artistas que eu queira contactar para trabalhar de momento.
Durante esta década passada, têm vindo a aparecer cada vez mais bandas de post-rock instrumental. Como é que isto mudou a vossa abordagem em relação à música? Quais são algumas das bandas que ouves?
A minha primeira digressão com a banda foi em 2008, onde fizemos umas datas com os Red Sparowes. Lembro-me do “post-rock” ter sido falado durante uma conversa no backstage e o nosso guitarrista Mike ter perguntado “o que é esta cena post-rock que eu tenho vindo a ouvir falar?”.
O guitarrista dos Red Sparowes, o Cliff, soltou um riso e disse “uh, esta cena que nós fazemos… isso é post-rock”. Agora parece ser uma questão absurda, mas quando a banda começou, esse rótulo não estava no nosso radar. É como alguém se referir a Fugazi ou Shellac como “post-hardcore”. Não serão essas bandas, sei lá, punk? Os Russian Circles apenas queriam ser uma banda com bastantes dinâmicas e drama musical. Não estávamos a tentar pertencer a um som ou a uma cena específica. Honestamente, nós estávamos preocupados em ser agrupados com música mais frenética e matemática, como Hella, Don Caballero ou Lightning Bolt. Isto não é para ser entendido como algo mau, mas nos meados dos anos 2000, esse tipo de coisas pareciam estar a florescer e nós não queríamos parecer como se estivéssemos a saltar para esse comboio. Mas em vez disso, fomos arquivados junto de todas as bandas que surgiram com o nascer dos Explosions in the Sky e francamente, essas coisas não nos interessam. Quero dizer, nós gostamos de Tortoise, Labradford, Trans Am e Godspeed You! Black Emperor, mas não penso que muitas dessas bandas tenham muito em comum entre si.
Se eu for ouvir rock instrumental, é muito mais provável ouvir Popol Vuh, The Meters ou um dos primeiros três álbuns dos Kraftwerk. A maior parte das coisas que são categorizadas como sendo post-rock não me atraem muito. Posto isto, eu ouvi um par de álbuns dos Growing na noite passada, se calhar eles contam como uma banda de post-rock?
Quais dirias que são algumas das tuas influências tanto dentro como fora da música?
Eu estou sempre interessado em artistas que criam a sua própria subcultura. Sempre que alguém é capaz de cravar um sítio para eles próprios fora do mainstream, vejo isso como algo inspirador. Isso pode parecer algo um pouco óbvio, mas eu sinto que muitas vezes as pessoas não vêem os paralelos entre, digamos, os Beats, as bandas de krautrock, os dadaístas, os músicos de free jazz dos anos 70, as bandas de hardcore dos anos 80 e 90, os surrealistas, os realistas mágicos, os artistas de desert blues do Mali, e por aí fora. Se fizeres algo e isso tiver sucesso fora do comercialismo massificado do Ocidente, então é excitante para mim.
Durante a carreira da banda, houve numerosas visitas a Portugal. Que boas lembranças tens de actuar cá? Algum concerto em particular que te salte à memória?
Nós amamos Portugal. Desde que tocamos cá com These Arms Are Snakes em 2008, que estamos ansiosos por viajar por Lisboa e Porto. Tocar no Amplifest com a Chelsea Wolfe e Body/Head em 2013 foi um grande destaque. Honestamente, eu amo andar pelas ruas da cidade e conduzir pelas zonas rurais. As paisagens são lindíssimas.
O que mais estás à espera nesta próxima digressão europeia com Torche e do vosso regresso a Portugal em Março?
Estou excitado pela Península Ibérica, para ser completamente honesto. Estou pronto para o ar quente e o sol, as ruas de azulejos, o marisco e a recepção calorosa por parte das pessoas. Eu amo esse canto da Europa.
Para além desta próxima digressão, vocês têm também umas datas marcadas no Japão e nos Estados Unidos. Após essas se realizarem, o que vem a seguir para os Russian Circles?
Vamos começar a escrever novo material, mas também iremos visitar cidades que falhamos em digressões anteriores em promoção ao Blood Year.
Entrevista: Filipe Silva