Entrevista com Miguel Santos (A Dream Of Poe)

A Ruído Sonoro esteve à conversa com Miguel Santos, mentor e único membro fixo do projecto nacional de Doom/Gothic Metal, A Dream Of Poe.

 

RUÍDO SONORO: A Dream Of Poe, um homem, um projecto. Podes dizer-nos como começou este “sonho”?
MIGUEL SANTOS: Este sonho surgiu em 2005, pela necessidade de me expressar livremente, sem restrições ou necessidade das minhas composições terem de agradar a outros músicos. A realidade é que, quando trabalhas em formato banda, tens de contar sempre com as ideias, gostos pessoais e musicais de cada elemento, o que no fim pode transformar a música em algo muito diferente daquilo que imaginavas inicialmente, tanto para o bem como para o mal. Não quero com isto dizer que não gosto de trabalhar em contexto banda, muito pelo contrário, mas no caso de A Dream Of Poe prefiro, por enquanto, manter como projecto a solo.

 

RUÍDO SONORO: Para termos uma pequena noção, como é que uma só pessoa concilia o seu tempo de forma a poder tratar de tudo o que envolve o lançamento de um álbum?
MIGUEL SANTOS: É muito complicado e é exactamente nessas alturas que dava muito jeito A Dream of Poe não ser um projecto a solo. Conciliar o tempo necessário para tratar o lançamento de um trabalho com a vida pessoal, ensaios de In Peccatum e ainda com o estúdio não é tarefa fácil e requer que se trabalhe por vezes pela noite dentro. Felizmente, com alguma ginástica, tenho conseguido conciliar isto tudo. Requer algum sacrifício, mas vale a pena o trabalho, principalmente quando o álbum é tão bem aceite quanto o The Mirror Of Deliverance.

 

RUÍDO SONORO: Uma demo, um álbum ao vivo, dois EP’s e agora o álbum de estreia. Quando olhas para trás, que balanço fazes da evolução do projecto?
MIGUEL SANTOS: Esforço, luta, dedicação, motivação e o acreditar em mim e neste projecto. Se todos estes elementos não se tivessem conjugado, dificilmente estaria aqui hoje. Quando olho para os meus trabalhos, vejo-os como as etapas e as metas que atingi, representam a minha evolução como pessoa, como músico, produtor e, directamente ligado a isso, a evolução de A Dream of Poe. Todos esses trabalhos, até mesmo o Delirium Tremens, que pouco ou nada terá a ver com o som actual de A Dream of Poe, foram importantes para a maturação deste projecto.

 

RUÍDO SONORO: Edgar Allan Poe e My Dying Bride, duas influências óbvias e uma mistura explosiva. Porquê a fusão de Poe com Doom Metal? Que outras influências te inspiram?
MIGUEL SANTOS: Julgo que foi uma fusão muito natural e lógica, Poe tem tudo a ver com Doom Metal e, para além de nós, existem muitas outras bandas que se inspiram em Poe, seja directa ou indirectamente. Quer de forma consciente ou inconsciente, existem muitas fontes que me servem de inspiração. Normalmente componho quando estou simplesmente a tocar sem qualquer rumo ou objectivo definido; aí surgem diversas ideias que caso me agradem tento desenvolvê-las. O que influencia essas ideias são as minhas vivências, o mundo e a sociedade em que vivo, o modo como olho para o que me rodeia; a nível mais cultural, por aquilo que leio ou ouço.

 

RUÍDO SONORO: Qual o conceito de The Mirror Of Deliverance?
MIGUEL SANTOS: The Mirror of Deliverance é uma viagem surreal pela consciência, pelo Mítico, Belo & Grotesco; pela destruição plena de tudo de modo a reconstruir algo perdido numa forma nova. Um apelo à evolução & à consciência através de símbolos & arquétipos. Uma experiência em magia, arte & música.

RUÍDO SONORO: Este álbum de estreia tem apenas uma música em português. E porque não um álbum todo na nossa língua materna?
MIGUEL SANTOS: Nunca pensei em editar um álbum cantado por completo em português, mas também não vou dizer que nunca o farei. Considero improvável mas não impossível.

 

RUÍDO SONORO: Uma banda açoriana tem sempre dificuldades em projectar-se no continente, ainda mais quando se trata de um homem só. Tens planos para a promoção do álbum no continente?
MIGUEL SANTOS: Para já não. Nós estamos a preparar uma digressão europeia que terá lugar de 10 a 19 de Novembro, mas por uma questão logística não será possível fazer uma paragem no continente para dois ou três concertos. Ainda assim, espero num futuro próximo ter a oportunidade para me apresentar ao vivo em Portugal continental.

 

RUÍDO SONORO: Que pessoas te costumam acompanhar nos concertos ao vivo?
MIGUEL SANTOS: Para actuações ao vivo tenho contado com o apoio de alguns músicos, apenas com algumas alterações desde o primeiro e segundo concerto para o line-up actual. Nas primeiras duas aparições ao vivo contei com o apoio de David Melo na bateria, António Neves na guitarra, André Gouveia no Baixo, Stephan Kobiákin nos teclados e Paulo Pacheco na voz. Este line-up funcionou na perfeição nos dois concertos que fizemos juntos, contudo, fruto de decisões pessoais de alguns músicos como também da necessidade especifica de A Dream of Poe, este line-up sofreu algumas alterações. Actualmente, dos músicos referidos, apenas o António Neves e o André Gouveia fazem parte do lineup. Assim, para completar o line-up, conto com a ajuda do João Oliveira na bateria e João Melo na voz. Por opção, e uma vez que não faço uso de teclados em The Mirror of Deliverance, também não os usarei ao vivo. De notar que à excepção do João Melo, todos os outros músicos fazem parte de In Peccatum.

 

RUÍDO SONORO: E quanto a um futuro como banda? Existe a possibilidade do futuro do projecto A Dream Of Poe passar pelo estabelecimento de membros fixos, nomeadamente daqueles que já tocaram contigo?
MIGUEL SANTOS: Por vezes penso nisso, mas apesar de haver muita amizade entre nós para alem do circulo musical que nos circunda, julgo ser difícil isso acontecer com eles e a razão é muito simples, como todos nós (à excepção do João Melo) fazemos parte dos In Peccatum, partilhamos ideias e composições. In Peccatum acaba por se mover no mesmo meio que A Dream of Poe, mas com as devidas diferenças e tendo uma identidade própria. No caso de estabelecer esses mesmo membros como fixos, participando todos no processo de composição, poderia ocorrer uma certa contaminação em que A Dream Of Poe começaria a soar mais a In Peccatum e vice versa. Julgo que incorreríamos no risco de perder a identidade de uma ou mesmo de ambas as bandas. Ainda assim, considero-os como membros fixos para a apresentação de A Dream Of Poe ao vivo, pelo que sempre que estejam disponíveis serão eles a subir ao palco comigo.

 

RUÍDO SONORO: A crítica nacional e internacional a este álbum está a ser bastante positiva. Isto motiva-te para um segundo trabalho? Algumas ideias já em mente?
MIGUEL SANTOS: De facto, a critica a este trabalho tem sido muito boa, o que me surpreendeu pela positiva. Motiva-me no sentido de que o meu trabalho foi reconhecido e mantém em mim a força para continuar com o projecto contra todas as adversidades que possam ocorrer, pois sei que valerá a pena e que o meu trabalho será ouvido. Ainda assim, essas criticas são um acrescento de responsabilidade, pois terei de me superar ou pelo menos fazer um trabalho tão bom quanto The Mirror of Deliverance. Já me surgiram algumas ideias e registei-as de forma a não as perder, de qualquer modo para já estou centrado na preparação da digressão e só com o término da mesma me debruçarei sobre o processo de composição de um novo álbum.