É o triunfante regresso de uma das maiores vozes de todos os tempos e um dos mais recordados ‘frontmen’ da história do rock. Não há muita história de álbuns a solo de Steve Perry, de recordar o êxito Street Talk de 1984, um álbum tipicamente anos 80, fortemente apoiado no auge que os Journey atravessavam com Perry no leme. Apesar de não se falar muito do álbum, é um lançamento dominante da década de 80, com faixas que se mantiveram no goto da indústria do rock, sobretudo soft-rock.
O único álbum a solo da Steve Perry foi lançado antes de um lançamento dos Journey Raised On Radio, em 1986, o que acabou por precipitar um hiato, devido à recusa de Perry em continuar com a banda, devido a desgaste ou falta de vontade. Muito se falou sobre a sua saída, muito já foi dito pelos membros e pelo próprio Perry, mas em 1996, a banda regressa para lançar Trial By Fire – um álbum derradeiro que deu aos fãs um último gostinho do que foram os Journey e tudo o que representaram para a música. Mas foi uma reunião de pouca dura, com a saída de Perry em 1997, entrou para o seu lugar Arnel Pineda, um jovem com uma voz tão mágica como a de Steve.
Volvidos mais de 20 anos, Steve Perry faz um regresso triunfante com um disco que vai buscar muito dos temas recorrentes dos Journey e da sua carreira a solo, interpretando-os de uma forma mais madura e mais completa. É uma mudança de 180 graus por comparação a Street Talk – em que ainda se notava uma juventude rebelde – conseguindo uma interpretação bem mais apurada e mais constante, com uma banda de apoio altamente produzida e trabalhada.
Cheguei a ler algures que esta era uma tentativa fugaz para voltar à música, uma tentativa mal-sucedida e fracassada para tentar recuperar o brilho de outros tempos. É dos maiores disparates que li, sobretudo quando há muitas outras bandas que tentam fazer isso mesmo, enquanto estão no activo e a lançar álbuns de cinco em cinco anos. Steve Perry regressa com um álbum sólido, que apesar de não ser fantástico, também não compromete. Perry não inventa nem tenta inovar com um estilo novo apenas para exibir a sua voz – que por sinal continua fantástica – nem para atrair novas audiências. Traces mantém a fórmula pela qual Perry sempre foi conhecido ao longo da sua carreira. É um disco intimista, sensível e, por vezes, vulnerável e romântico. As faixas são todas muito melódicas e variam de humor ao longo do álbum. Perry também não tentou manter nada em segredo, visto que lançou três das principais músicas ainda antes do lançamento do disco, o que demonstra a vontade de satisfazer os fãs eternos da sua carreira a solo e da sua carreira nos Journey.
Apesar de o registo ser semelhante, surpreendentemente, contém alguma diversidade. Uma diversidade completa por músicas tristes e baladas muito intensas, como as “In The Rain”, “We Fly”, “Sun Shines Gray” e “We’re Still Here”, esta última a minha favorita. Mas é fácil de entender esta diversidade, este disco parece que foi escrito ao longo destes seus últimos anos fora do circuito musical. A vida é feita de altos e baixos, e este álbum reflecte exactamente isso, nunca deixando nada ao acaso e cada milímetro foi detalhadamente trabalhado. Este é um álbum de Perry e de mais ninguém. É um lançamento para os fãs e para aqueles que sempre apoiaram a sua carreira a solo e a sua carreira nos Journey. Não tenta, de todo, reclamar uma posição antiga nem demarcar a sua presença para o futuro. Traces contém a intimidade e o romantismo privados de um dos grandes vocalistas da sua geração e de uma das grandes referências mundiais da música.
Como disse anteriormente, este é um regresso triunfante, cheio de cuidado e carinho, ao mesmo tempo que é triste e precavido. É um disco para os fãs apreciarem, ouvirem e reflectirem.
Autor: João Braga