Russian Circles no Hard Club. Chegada ao ano de sangue

Texto: Bruno Correia

A ansiedade do regresso aos concertos era palpável e devia-se a um elefante na sala do qual é impossível não falar. É que, em Novembro de 2019, quando os Godspeed You! Black Emperor tocavam as últimas notas do seu concerto no Hard Club, ninguém imaginava que seriam preciso 901 dias para poder voltar a marcar presença num sempre incrível evento organizado pela Amplificasom. Mas assim teve de ser, e a saudade deu lugar à excitação dos que esgotaram a sala e marcaram presença neste auto-intitulado Ampliregresso.

Também de regresso estavam os Russian Circles a Portugal, trazendo consigo os seus compatriotas Helms Alee, numa repetição de um alinhamento exclusivamente norte-americano que aconteceu sete anos antes, quase exactamente à semana, também pela mão da Amplificasom.

Foram os Helms Alee os primeiros a entrar em palco e não foi preciso muito tempo para que a Sala 2 do Hard Club ficasse praticamente cheia. Com novo álbum lançado precisamente no dia do concerto em destaque, a sucessão “See Sights Smell Smells” e “Keep This Be The Way”, temas que dão início ao disco, marcaram também o início daqueles que seriam 50 minutos de actuação.

As dinâmicas que nos prendem quando ouvimos os álbuns do trio dos Estados Unidos acabavam por aparentemente não resultar tão bem ao vivo esta noite. Talvez por isso, ou talvez pelo alinhamento que traziam consigo, a actuação, de forma geral, nunca pareceu ganhar o embalo que se esperava. Ainda assim, um concerto bastante sólido e com vários pontos altos numa passagem pela discografia da banda que terminou com um regresso a 2016 ao som de “Gallopping Mind Fuk”.

A preparação do palco para Russian Circles levou, como esperado, a que os três microfones fossem retirados. Para onde a banda nos leva não são preciso microfones, já que o foco desta viagem é puramente instrumental. Ideia, aliás, que os Russian Circles levaram à letra ao vivo, ao longo de um concerto inteiro sem dizer uma palavra, nem mesmo entre músicas.

Era Blood Year o trabalho mais recente que traziam consigo. O álbum, lançado em 2019, não se pode considerar novo mas, dado o período de quase hibernação em que vivemos no par de anos que passou, mantém-se fresco e a sua apresentação ao vivo é mais que bem-vinda. Foi nesse registo que o concerto teve início, com uma longa introdução à qual se seguiu “Arluck”, do último álbum.

Michael Sullivan e a sua pedaleira, com uma enormidade de pedais de guitarra diferentes, eram como que os maestros que dirigiam esta orquestra que não precisa de mais do que três membros para tornar a atmosfera bem pesada. O trio apresentou-se imaculável e as poucas paragens entre temas pareciam quase ser mais necessárias para o público ganhar fôlego do que para a banda de Chicago, que continuava a mostrar por que razão é tão acarinhada pelo público português.

Tendo o foco, como esperado, sido o último lançamento, não faltou tempo para voltar atrás no tempo e tocar algumas das que acabaram por ser as mais aplaudidas da noite: “309”, do aclamado Empros de 2011, e “Youngblood”, com a qual terminaram o concerto. Uma hora e vinte minutos quase sem paragens que certamente deliciaram todos os presentes.