NOS Alive. Recitais de rock marcaram a 11ª edição do festival

À 11ª edição, o NOS Alive esgotou na totalidade com três meses de antecedência. Tamanha proeza não é menos do que um borrão de letras vermelhas sempre que se fosse comprar bilhetes, mas sim um produto natural da capacidade de continuidade do festival. Aqui a responsável é a promotora Everything Is New que todos os anos se molda às preferências nos grandes nomes sem fechar os olhos ao que se pode passar nas novas tendências para outros dos seus palcos que não o principal. O Palco NOS foi, para grande maioria, o ponto central do NOS Alive. Para outros, foi no Palco Heineken que se pôde assistir a alguns dos melhores concertos.

Dia 1 – 6 de Julho

Num dia em que no Palco NOS se apostou naquilo que a alternativa pop pode oferecer aos grandes festivais, o primeiro grande arrastar de multidões deu-se com os britânicos alt-J. Com a “fava” do final da tarde e em claro downgrade horário – lembre-se que actuaram antes dos headliners Muse em 2015 – o trio apresentou o novo álbum, Relaxer, em jeito de trunfo prematuro. Ao terceiro disco a banda continua a investir numa fórmula já descolorada, teimando em seguir à risca uma espécie de tutorial que os próprios escreveram. Vozes sobrepostas, pitch alterado a cada par de compassos e reverberações constantes para nos lembrar que “Taro” é melhor faixa se for a fechar e que “Every Other Freckle” e “Fitzpleasure” partilharam o seu óvulo. An Awesome Wave já tem cinco anos e continua a ser foco central dos alt-J, que colocam o seu tempo de antena maioritariamente neste álbum, fazendo acreditar que nem os próprios aprovam as tentativas seguintes. A popularidade e a recepção, no entanto, indicam o contrário. O regresso já marcado a Lisboa já em Janeiro, no MEO Arena, é prova disso.

Também de regresso a Algés os franceses Phoenix trouxeram-nos o fresquíssimo Ti Amo, o seu vigésimo aniversário e uma panóplia de indie rock e pop – um som condizente com a plateia que dançou cada segundo do concerto. “Entertainment”, “Lasso” e “Litszomania” foram lançadas cedo no alinhamento e o público foi-se mantendo por perto em cada uma das faixas seguintes, ora pelas projecções multi-coloridas e diversificadas, a roçar até o psicadelismo menos ácido, até que se dá pelo final de um desfile de melodias orelhudas culminado pela dupla “1901” e “Ti Amo Di Piu”. Uma passagem de testemunho do seu hit maior para um novo single capaz de carregar estes Phoenix para um novo escape do indie europeu, apesar do foco maior continuar em Wolfgang Amadeus Phoenix, disco que catapultou a referência sonora desta malta de Versalhes. Um brinde indie rock à 00s, servindo-se até o vocalista Thomas Mars para “surfar” por cima de várias cabeças das filas da frente em jeito de au revoir. À grande e à francesa. Do Palco NOS para o Clubbing essa conexão não sorriu tanto à norte-americana Jessy Lanza, uma nova coqueluche da Hyperdub que ao seu terceiro set em Portugal em quatro meses continua sem uma clara expressão da sua fanbase, não motivando paragens na caminhada de festivaleiros para Ryan Adams no ponto oposto do recinto.

 

Na recorrência dos regressos a Algés, os The xx assumiram da forma que puderam o destaque que lhes foi dado. Quatro anos volvidos deste Night + Day, festival que os britânicos instalaram em Belém, foi restabelecida uma ligação com Portugal pronta a meter os pontos nos “i”s. Mas para isso foi preciso ultrapassar algumas adversidades e dificuldades demonstradas nas primeiras faixas, onde a saudade fez má cara com erros nas tonalidades de “Intro” e “Crystalised”. Lembrado o primeiro disco, que prontamente destacou os The xx no panorama alternativo, depressa se reconhece o papel que Jamie Smith agora desempenha, num misto de produtor e DJ com os beats a estarem mais notórios do que nunca. Surpresa seria para os que não escutaram I See You, o disco lançado no início deste ano e que é uma declaração à pop electrónica. Assim se explica porque é que o lead da guitarra de “Chained”, nas mãos de Romy, tomaram a direcção de “You Better Off Alone”, clássico de eurodance do início do milénio, mas também é piscado o olho às reverberações cintilantes de Chris Isaak em “Nights”. Num sentido ascendente, onde o público se começa a desprender cada vez mais nas filas de trás, Oliver Sim, voz e baixo, admite gostar de actuar em festivais, porque o público deixa as suas preocupações em casa para dançar. Assim nos dão “Loud Places”, faixa “emprestadada” de Jamie xx com Romy na voz, fazendo o seu refrão todo o sentido para as 50 mil pessoas que encheram o recinto.

 

Do indie de Londres para o rock de Brighton, migrou-se em direcção ao Palco Heineken para testar decibéis através da distorção de uma dupla. Os Royal Blood entraram em cena em jeito meio caliente, ao som de “Down In Mexico” dos Coasters, para aumentar a temperatura a cada riff de um baixo transformado em guitarra através dos milagres da modulação de oitavas. Mas não foi necessário ter muita atenção ao que se passava em palco para perceber que estes Royal Blood já são outros em relação àqueles que se estrearam em Lisboa em Abril de 2015. O fundo é preenchido de iluminação vertical e aquele baixo da Gretsch foi substituído por múltiplos Fender Jaguars. O número de amplificadores? Duplicou. Mike Kerr tem o dobro do arsenal ao seu dispor e Ben Thatcher continua a atacar a bateria com a mesma concentração em detrimento da fúria. Felizmente esses factores transparecem na forma como os temas do novo álbum, How Did We Get So Dark?, são tocados ao vivo. Em estúdio falta a robustez que em Algés se testemunhou e os refrões vingam quando acompanhados por milhares de fãs. O resultado é uma sinergia in-your-face de fácil receita, onde uma bateria, uma guitarra-que-afinal-é-um-baixo e um rodeio de riffs melódicos constituem um furacão rock. No final, quando “Figure It Out” e “Out Of The Black” permaneceram no ouvido como favoritas da maioria, ficou-se com a certeza que poucos anos faltarão para Kerr e Thatcher pegarem nas suas trouxas e colocarem-se na rota dos estádios e nos palcos principais dos grandes festivais.

 

A encabeçar o primeiro dia de NOS Alive, o canadiano Abel Tesfaye provou porque é que meia-década é já quanto basta para se colocar no topo do mundo da pop. Tinha apenas 20 anos quando utilizou o YouTube para se apresentar como The Weeknd e um ano depois jogava-se a três brilhantes mixtapes. Não se nasce uma estrela, mas Abel pouco tempo aguentou os pés no chão. Hoje é “Starboy”, nome do primeiro single do álbum com o mesmo nome, e assim se apresentou na subida ao Palco NOS replicando com exactidão a voz que conhecemos das rádios. Engane-se no entanto que o espectáculo se tenha encostado à figura central. Existiram projecções e jogos de luzes coordenados com fogo, potenciados pelos graves que atacaram o PA faixa atrás de faixa. “Wicked Games”, “Often” e “In The Night” fizeram parte do miolo do alinhamento que contou com uma recta final repleta de êxitos maiores da (ainda) curta carreira de Tesfaye. O número de telemóveis que se ergueram para filmar “Can’t Feel My Face” deram uma boa fotografia para quem estava mais atrás, “I Feel It Coming” só mostrou ao vivo porque é que é uma das mais agradáveis faixas pop dos últimos anos e “The Hills” voltou a lembrar que é de amores difíceis que se fazem bons singles. Longe do seu mood meditativo e depressivo marcado pelas referidas mixtapes, a introspecção transformou-se em dança e num espólio de singles que “todos” acabam por conhecer. Assim se reconhece uma estrela maior da pop.

Os que ainda aguentaram mais um par de horas no recinto a uma quinta-feira encontraram um set de Bonobo no Palco Heineken, em que os seus arranjos electrónicos foram interpretados por uma quantidade exorbitante de músicos constituindo-se uma atmosfera gélida em noite quente. Já perto da hora de fecho, foram os Glass Animals que arrancaram uma das mais energéticas prestações do NOS Alive num festim de cores, ritmos electrizantes e abanar de ancas imparável. Fosse a outras horas e o cansaço não teria assistido também ao concerto, portanto aguarda-se com alguma ansiedade uma apresentação em nome próprio de How To Be A Human Being.

Dia 2 – 7 de Julho

Um sol que ainda queimava a pele ao final da tarde encontrou um arquinimigo na sombra do Palco Heineken, bem composto para receber as Savages. “I Am Here” foi canção de abertura, espécie de olá em violência sónica, em que a banda de Londres disparou ruídos em todas as direcções. Enquanto o som não ajudou, assim como o ritmo imposto pelo alinhamento escolhido, Jehnny Beth, frontwoman destas femme fatale, não demorou muitos minutos até tirar os seus sapatos vermelho escarlate para descer ao público, compensando de forma física aquilo que o instrumental visceral de Gemma Thomson, Ayse Hassan e Fay Milton tardou a obter. Eventualmente os trunfos acabaram por ser guardados para o fim, um de cada vez, com ponto alto em “The Answer”, cujo vídeo foi precisamente gravado numa anterior visita a Lisboa, convidando novamente Beth a pôr-se sobre o público. Um concerto longe de perfeito, a gritar por uma atmosfera mais condizente com aquilo que Adore Life propõe debater.

Felizmente o post-punk encontrou um oponente menos frio e mais preparado para a réstia de temperatura escaldante: um trio de sorrisos, melodias electrizantes e ficou aberta a Pista para revelar alguns temas que vão suceder o seu álbum de estreia, Bamboleio. A banda do Barreiro tratou de transformar o Palco NOS Clubbing num pequeno clube de camisas floridas e o convidado Alex D’Alva Teixeira agarrou o microfone para a nova “Campipraia” e ainda para as já sabidas e decoradas “Sal Mão”, “Puxa”, “A Tal Tropical” e a longa “Queráute”. Haverá banda que lute mais pelo Verão do que esta?

 

A réstia de calor da tarde susteve-se para as norte-americanas Warpaint. De regresso a Portugal três anos depois da apresentação do seu álbum homónimo, foi o novo Heads Up motivo de visita a um palco que já conheciam. A faixa-título desse novo trabalho e “Krimson” serviram de teste antes de nos jogarem “Undertow”, cartão-de-visita maior do álbum de estreia, e garantirem quem tinham de garantir nas primeiras filas antes das espirais de vozes e reverberações assaltarem as faixas seguintes, tornando até uma “Beetles” quase imperceptível para quem estava mais ao fundo na tenda do Palco Heineken. Como uma tentativa de reset, as Warpaint partem para a sequência de “Intro”, “Keep It Healthy” e “Love Is To Die” do álbum anterior à procura de endireitar a moldura. Mas ainda antes da final e viciante “Disco//Very”, não hesitaram em mostrar que “New Song” é daquelas músicas fáceis demais de enjoar.

 

As horas difíceis de um dia preenchido acabariam por chegar para uma divisão do público. De um lado do recinto, no Palco Heineken, coube aos Wild Beasts voltar a somar pontos na electrónica indie. Uma dissertação sonora para se dançar Boy King em detrimento de momentos tão obrigatórios como “Hooting & Howling”. O mais recente esforço dos britânicos, ainda que aquém do que nos habituaram, não se mostrou menos competente quando interpretado ao vivo ao lado de “A Simple Beautiful Truth”, “Mecca” e “Wanderlust”, arrancados do seu directo antecessor. Ainda bem.

 

Já do outro lado, o fogo de Alison Mosshart e o gelo de Jamie Hince deixaram no NOS Alive um misto de apresentação de Ash & Ice e uma viagem pelos seus primeiros álbuns. Os The Kills há já quase duas décadas que são aquela banda que todos gostaríamos de formar ao empenhar uma guitarra e ao conhecer uma frontwoman tão dominante como Mosshart. Na verdade o desejo só pôde aumentar ao receber aqueles malhões de Midnight Boom e ainda as visitas singulares a No Wow e a Keep On Your Mean Side, discos gigantes mas que não conseguem transportar o seu garage rock para um palco com as dimensões que os recebeu. E muito menos para a plateia que os confrontava, já preenchida para receber os Foo Fighters. Quem perdeu, na verdade, foi uma grande fatia do público. Quem ganhou foram os fãs mais dedicados que não deixaram de os acompanhar nas letras. Os The Kills? São grandes de qualquer forma.

 

O momento da noite – e para muitos, o momento do festival – deu-se com o regresso de Dave Grohl e companhia a Portugal. Tal sede de rock e saudades de um dos ícones maiores do género da actualidade correspondia a um recinto lotado para invocar o espírito do rock em Algés (tarefa ainda mais facilitada quando são jogadas faixas de Slayer pelo PA). Os Foo Fighters subiram ao Palco NOS e, com a força com que o fizeram, ficaram com o mundo a seus pés num ápice. Quem abre com “All My Life” e segue para “Times Like These” e “Learn To Fly”, quase sem parar, angaria com facilidade novos fãs aos milhares que se arriscaram a perder o fôlego logo nos primeiros minutos do concerto. Ao quarto tema, “Something From Nothing” constrói-se sobre a história da cena musical de Chicago – e naquele riff descarado de “Holy Diver” de Dio – para culminar com Dave Grohl a dirigir as primeiras palavras orientadas à plateia. Estava iniciado um desfile de rock de duas horas e meia com direito a medleys de Queen e Ramones e a um vislumbre ao novo álbum, Concrete And Gold, ainda por lançar – sim, Alison Mosshart subiu ao palco para um dueto de “La Dee Da” para um dos pontos mais altos de todo o festival. Pelo meio um cheirinho de cada disco e o tempo de diálogo a aumentar exponencialmente. Em “Monkey Wrench”, numa das três visitas ao célebre The Colour And The Shape, Grohl desce ao público para acarinhar os milhares de maratonistas do rock que ainda receberam os mimos de “Run”, novo single, e “This Is A Call” para a despedida de palco. No regresso para o encore, Dave garantiu que estava disposto a gritar toda a noite, atacando o microfone com a mais áspera das suas vozes. Mas foi “Best Of You”, um dos temas mais suaves e reconhecidos da carreira, que encavalitou casais e levantou os telemóveis para fotos e vídeos. Mas estava ainda guardada uma jam de Foo Fighters a tocarem por cima dos cânticos do público e, como não podia deixar de ser, a imortal “Everlong”.

Quem não aguentou tamanha dose – e não podemos todos gostar do amarelo, não é? – Parov Stelar e a sua banda agarraram uma tenda cheia para a after-party ideal depois de um dia recheado de rock. Electroswing, ginga maldita que nos deixa irrequietos mesmo com dor de pernas. Um cansaço acumulado que se desvaneceu em suor. Uma, duas, três vezes, quantas faixas foram? Não interessa realmente. Há três anos o austríaco actuou no festival apenas devido ao cancelamento de Chromeo e em 2017 voltou a provar que não deve ser substituto de ninguém, reclamando até mais visitas. Portugal agradece.

Dia 3 – 8 de Julho

O terceiro e último dia de NOS Alive preencheu-se mais cedo do que o habitual – um sábado encabeçado por Depeche Mode foi uma conjugação perfeita para que os bilhetes diários correspondentes fossem os primeiros a esgotar. Mas quem divagou pelo recinto encontrou os seus habituais brindes pela tarde fora em activações de marca distintas e tropeçou em diferentes ofertas mais familiares: o Palco Comédia para aliar o humor à sombra, o EDP Fado Café para múltiplas sessões intimistas de fado e o Palco Coreto by Arruada para encontrar alguns novos talentos portugueses (para os mais atentos, não assim tão novos).

O Palco NOS arrancou com o blues de The Black Mamba e meia-hora depois o Palco Heineken recebeu Benjamin Booker, mas quem faltou à chamada do Lux Frágil nesse fim-de-semana teve Mr. Herbert Quain no Palco NOS Clubbing como prémio de consolação. Isto tudo a acontecer ao mesmo tempo que se fazia o balanço desta 11ª edição do festival, esgotado três meses antes de arrancar e que estabeleceu um recorde próprio nesse sentido. Também foi, à sua 11ª edição, que o NOS Alive viu nascer o “seu” primeiro filho – uma grávida que entrou em trabalho de parto durante The xx e que testou as capacidades de resposta do festival, que a acompanhou até ao hospital.

 

Calculados os números e vistas as contas de 2017, foram os Spoon o veículo ideal para conduzir à recta final. No Palco Heineken, e apesar de já terem concertos marcados em Lisboa e no Porto em Novembro, os texanos contrariaram o fluxo de festivaleiros à procura de Kodaline no ponto oposto do recinto. Aqui apresentou-se Hot Thoughts, lançado no passado mês de Março, e ao nono álbum não há nada a provar de Britt Daniel e Jim Eno. Longínquo já vai o ano de ‘93 em que se formaram, mas a resiliência sónica que envergam tem-lhes dado a capacidade de mutação dentro do rock, do indie ao psicadélico na construção de delicadas canções. Delicadas no acabamento e não no toque, que aqui também se dança, salta e canta – de “Anything You Want”, de Girls Can Tell que lhes ajudou a catapultar para a fama, passando por Ga Ga Ga Ga Ga e ainda por They Have My Soul, anterior disco que contribuiu com “Rent I Pay” para fechar um dos claros destaques deste NOS Alive. E o melhor é que daqui a uns meses há mais.

 

Os Fleet Foxes também passaram pelo festival para tirar a barriga de misérias. E fizeram-no logo após uma longa pausa e com o novo Crack-Up, lançado seis anos depois do anterior e aclamado Helplessness Blues. Já sem Josh Tillman na bateria – recorde-se que saiu em 2012 e abraçou a sua persona Father John Misty desde então – os Fleet Foxes não se deixaram parar no fantasma que tamanha figura o ex-membro assumiu. Este terceiro disco parte precisamente de onde Helplessness Blues nos deixou e transparece isso para o palco e Robin Pecknold e companhia, incluindo Matt Barrick dos The Walkmen na bateria, colocaram em Algés um pouco da folk conífera do estado de Washington que mendigou, a seu jeito, por um palco e um cenário mais condizente, frio e insociável.

 

As atenções maiores do derradeiro dia de NOS Alive prenderam-se na história e na influência de Depeche Mode. A vestir a camisola de Spirit, o mais recente álbum e 14º da carreira, o trio britânico propôs-se à revolução e encheu o peito de crítica social e política na hora de subir ao palco. “Going Backwards” foi, no entanto, entrada a meio-gás e a estranheza perdurou mesmo com “Barrel Of A Gun” ou “World In My Eyes”, músicas de eleição de uma longa discografia. Talvez apenas em “Wrong”, o único tema recordado de Sounds Of The Universe, se começou a desenhar uma linha de comunicação entre os Depeche Mode e uma plateia dividida. A tentativa de imposição da banda através dos visuais cénicos e dos beijos gesticulados por Dave Gahan contribuíram para aplausos maiores em “Everything Counts”, “Stripped” e “Enjoy The Silence” antes que “Never Let Me Down Again”, nem a propósito, pautasse o encore. O regresso ao palco deu-se com quatro temas obrigatórios dos três álbuns que marcaram os anos 90 do trio – “Home” visitou Ultra pela segunda vez, “Walking In My Shoes” e “I Feel You” espalharam fé e devoção sensual e “Personal Jesus” foi recebido com a maior ovação da noite. Ainda assim ficou um travo agridoce na apresentação do álbum menos inspirado que a banda lançou em muito tempo, ficando a ideia de que uma maior aposta nos três álbuns anteriores talvez não tivesse sido má ideia em contexto de festival.

Houve quem dissesse que os “reais” cabeça-de-cartaz do último dia foram os Cage The Elephant no Palco Heineken na maior enchente que este palco encontrou nesta edição. Um público bem dividido entre britânicos e portugueses recebeu os norte-americanos que se radicaram em Londres para escrever o percurso que conhecemos desde 2008: já lá vão quatro discos, dezenas de faixas orelhudas para perder a voz e uma abordagem ao vivo que agiganta todas as qualidades registadas em estúdio. Ainda que a apresentar o mais recente Tell Me I’m Pretty pela segunda vez a Portugal, foi o anterior Melophobia que recheou em maior quantidade o alinhamento guardado para Algés. “Spiderhead” continua a ser um eco demolidor para saltos e amigos às cavalitas e a recta final com “Cigarette Daydreams”, “Come A Little Closer” e “Teeth” serviram de confirmação que estes Cage The Elephant são uma das bandas maiores do indie rock global, com uma reencarnação de Mick Jagger nos maneirismos e na espontaneidade do vocalista Matthew Schultz e a certeza que já não há palcos demasiado grandes para gente como esta. Só têm de lhos dar.

 

A cereja no topo do bolo foi colocada pelos australianos The Avalanches, também no Palco Heineken, a transformar uma arena de rock numa pista muito própria de electrónica e hiphop à base de samples e boa disposição. Robbie Chater e Tony Di Blasi constituem uma dupla que se inscreveu na lista de melhores obras de sampling com Since I Left You em 2000 e repetiu a dose dezasseis anos depois com Wildflower e a transmutação para o palco em live set resultou em pleno com mais cinco membros: Paris Jeffree dominou os beats na bateria, Spank Rock debruçou-se no rap quando necessário, Eliza Wolfgramm e Oscar Vicent Slorach-Thro também dominaram os microfones e Jonti Danilewitz percorreu os ritmos da guitarra. Tudo isto e com “Because I’m Me” e “Frank Sinatra” logo em primeiro no alinhamento, tornou-se fácil somar sorrisos, abanar ancas, juntar vozes e dar para uma tenda folgada de espaço um dos concertos do festival em vários níveis. Na instrumentação os samples percorridos com sucesso, de Queens of the Stone Age a The Who “bastava” passar Beatles e Beach Boys algures lá no fundo, e os visuais no fundo proibiram caras trancadas – como era possível, com os fantasminhas de “Frontier Psychiatrist” a dançar à nossa frente e “Since I Left You” guardada para fechar o festival?

 

Para 2018 ficam já marcadas as datas, de 12 a 14 de Julho, e a garantia de que o NOS Alive apostará na sua receita de sucesso.

Fotografia: Rita Bernardo
Texto: Nuno Bernardo