Texto e Fotografia: Filipe Silva
Existe uma certa tendência e apetite em observar autênticos furacões de palco em dias de ameaça chuvosa. Já o teríamos feito no passado – recordemos a passagem do furacão Napalm Death pela cidade Invicta em 2017. O regresso dos mesmos estava marcado para a passada noite de 21 de Novembro, onde desta vez, a destruição maciça seria feita na capital e a chuva, apesar de não tão intensa quanto teria sido há seis anos atrás, marcou a sua presença na volta a casa.
Como já é hábito em noites dedicadas a um dos géneros mais extremos e pujantes, a abertura estaria nas mãos de duas jovens bandas que trilham caminhos distintos, mas com o mesmo objectivo. Primeiro, tivemos os nacionais Systemik Viølence, donos de uma mistura sónica que combina black metal, d-beat e crust de uma forma bem raivosa. O resultado é uma erupção eléctrica que nos aflige os músculos e fractura os ossos de forma incessante e impiedosa. Com um novo disco na bagagem, de seu nome Negative Mangel Attitude, os Systemik Viølence aproveitaram a oportunidade para apresentar temas deste novo registo, sem esquecerem temas de lançamentos anteriores como Anarquia-Violência e Satanarkist Attack.
A segunda parte da abertura estaria ao encargo dos Escuela Grind, banda norte-americana que espalha a boa palavra do grind e do powerviolence, levando à criação de mosh intenso e até de algum twerking. Que o diga Katerina Economou, vocalista da banda que, tal como o resto da banda, se mostrou incrivelmente energética durante todo o concerto, demonstrando o seu poderio vocal e a sua monstruosa presença em palco. Para a sua estreia em solo nacional, trouxeram na bagagem o seu mais recente longa-duração, Memory Theater, do qual tocaram uma panóplia de temas como “Endowed With Windows”, “All Is Forgiven” e “Cliffhanger”, aproveitando ainda para tocar novos temas como a caótica Ball and Chain, que brevemente aparecerá num futuro EP, DDEEAATTHHMMEETTAALL, e também onde fora convocada a primeira e única wall of death da noite. Um concerto absolutamente devastador e festivo que contará ainda com mensagens bem emotivas da banda, que demonstraram total apoio pela causa LGBT, apelando à união e solidariedade – mensagens essas cada vez mais importantes e necessárias nos dias que correm.
Se a violência já atingira um ponto alto com os concertos de Systemik Viølence e Escuela Grind, a mesma atingiria o auge durante Napalm Death. Por esta altura do campeonato, um nome como este já dispensa qualquer tipo de apresentações, o seu estatuto lendário e vasta discografia falam por si. De facto, poderia-se dizer que o mais recente longa-duração da banda, Throes of Joy in the Jaws of Defeatism, e o EP que lhe faz companhia, Resentment Is Always Seismic – A Final Throw of Throes, são os trabalhos que melhor definem uma banda que tem envelhecido como um óptimo vinho tinto. O começo do concerto deu-se de forma bem abrasiva e cataclismica com três temas pertencentes aos discos acima mencionados, nomeadamente “Narcissus”, “Backlash Just Because” e “Fuck The Factoid” – estava dado o mote para o resto da noite.
O inacreditável de um concerto de Napalm Death continua a ser o facto de que mesmo após quarenta anos de existência, a banda continua-se a mostrar altamente implacável tanto no seu som como na sua presença em palco. Enquanto Shane Embury despeja linhas de baixo bem potentes e grossas, Danny Herrera carrega forte numa vertiginosa multitude de ritmos de bateria, acompanhado pela guitarra precisa e esmagadora de John Cooke. No meio disto, temos o grandioso vocalista Barney Greenway a vomitar letras a uma velocidade estonteante e irada, recriando com perfeição o que todos nós sentimos ao assistirmos a todas as injustiças e desigualdades que assolam a nossa sociedade.
Tal como Katerina antes dele, também Barney aproveitara alguns momentos de ‘repouso’ entre músicas para se dirigir ao público, apelando sempre à união, à aceitação e à luta por um mundo melhor e mais igualitário. Estas mensagens seriam sempre recebidas de forma calorosa antes de malhas como “Scum”, “Amoral”, “Suffer The Children”, “When All Is Said And Done”, “Unchallenged Hate”, ou a eterna “You Suffer” marcarem presença e reiniciarem o caos e a desordem.
Antes do definitivo término do concerto, temos o comparecimento da já muito amada versão de “Nazi Punks Fuck Off” dos Dead Kennedys, música que se tornou imprescindível em qualquer concerto dos Napalm Death, e “Siege of Power”, que levou o gasto dos últimos cartuchos por parte do públicos. Contas feitas, cerveja sorvida e suor limpo, o rescaldo é extremamente positivo, considerando-se talvez o melhor aparecimento da banda em Portugal até à data. Digamos até à data, pois os Napalm Death têm uma capacidade extrema em superarem constantemente as expectativas do públicos. Fica apenas o desejo que não tardem muito em voltar a fazê-lo por cá.