O Evento
Texto por: David Matos
Fotografia por: Tiago Bartolomeu e André Henriques (onde assinalado), Agata Urbaniak (Brainderstörm) e Carlos Canau (1ª foto de Sol Invictus)
O festival gótico Entremuralhas é um evento único no nosso país, que decorre anualmente dentro das muralhas do Castelo de Leiria. Organizado pela Fade In, organização responsável por outros concertos/eventos de relevo no nosso país, este festival contou com a sua segunda edição este ano, durante os dias 29, 30 e 31 de Julho. Com mais um dia do que na primeira edição, o Entremuralhas 2011 pode contar com um cartaz ainda mais único, uma vez que grande parte do investimento do Entremuralhas 2010 pode ser aproveitado para este ano.
Depois de no ano passado ter trazido nomes como Project Pitchfork, Covenant e Ataraxia, este ano o festival contou com cinco estreias absolutas no nosso país, três delas de grandes bandas internacionais de culto: Nitzer Ebb, Rosa Crvx, Arcana, Irfan e Narsilion. No cartaz estava prevista ainda a estreia dos veteranos Suicide Commando em terras lusas, mas um problema de saúde impediu o vocalista Johan Van Roy de viajar até Portugal à última da hora. A substituição dos Suicide Commando num espaço de poucas horas foi, desde já, o maior desafio da Fade In neste evento, desafio esse superado com mestria e profissionalismo ao conseguir trazer a palco os leirienses ESC, talvez a melhor banda nacional de EBM/Industrial.
Limitado a pouco mais de 700 pessoas por dia, o Entremuralhas reúne fãs da cultura gótica não só do nosso país mas um pouco de toda a Europa, talvez pelas condições únicas e absolutamente mágicas de um festival desta natureza ser realizado num espaço gótico tão belo como o Castelo de Leiria. Uma atmosfera de cortar a respiração, com bandas de grande qualidade, outras actividades de interesse dentro do castelo, comércio gótico e um espírito de união entre todos os presentes tornam o Entremuralhas, muito mais do que um festival, um encontro anual único entre estranhos que partilham gostos comuns dentro de uma cultura com pouca expressividade no nosso país. O Castelo de Leiria é o espaço onde essas pessoas podem abrir os seus horizontes e sentirem-se, talvez mais do que em qualquer outro sítio, em casa. Por tudo isto, a Fade In merece todo o respeito ao ter conseguido criar este evento, sendo que a Ruído Sonoro agradece sinceramente a creditação que nos foi concedida para poder testemunhar e transmitir o melhor possível a todos o que se passou entre muralhas durante estes três dias.
Os Palcos
O Entremuralhas 2011 contou com três palcos distintos, todos eles de características únicas adequadas às actuações para eles previstas. O mais pequeno era o Palco da Igreja da Pena, dentro das ruínas desta igreja, bem no coração do castelo. Para ele estavam destinadas as actuações das Ignis Fatuus Luna, grupo nacional de dança do ventre, a estreia absoluta em palco dos portugueses Brainderstörm e a estreia em terras lusas dos espanhóis Narsilion. A atmosfera mística deste palco concedeu às actuações um ambiente magnífico. No entanto, o espaço revelou-se algo limitado nas actuações das duas bandas, que despertaram o interesse de mais gente do que aquela que a igreja podia comportar. O facto de só ter um pequeno portal de acesso também dificultou as entradas e saídas do recinto. Foi no entanto uma aposta acertada da Fade In, pois era impossível obter aquela atmosfera em qualquer outro lado. Um castelo não é um local projectado para concertos e a organização fez o seu melhor para aproveitar ao máximo o local.
O segundo palco era o Palco Alma, para as actuações de bandas de carácter mais acústico, espiritual e medieval. Delineado por uma imponente muralha do castelo, o espírito neste espaço era de paz e magia no ar. Para tal contribuíram as actuações ímpares de bandas tão únicas como Irfan, Sol Invictus, Sieben, Rosa Crvx, Trobar de Morte e Arcana. Mais três estreias no nosso país, com óbvio destaque para Rosa Crvx e Arcana, que deram outra dimensão a todo o festival, sem esquecer a surpreendentemente brilhante prestação dos Irfan.
A noite de concertos terminava sempre no terceiro palco, o Palco Corpo. Com uma estrutura mais ampla, situado perto da entrada do castelo, este palco tinha o espaço ideal para as bandas mais dançáveis a ele destinadas. As actuações de Nitzer Ebb, Eden Synthetic Corps e Diary Of Dreams meteram toda a gente a dançar ao som de ritmos electrónicos, envolvidos pelas altas árvores desta zona do castelo. Mais do que um palco, esta era uma autêntica pista de dança, com espaço para toda a gente se sentir confortável e se desinibir.
Concertos
Aqui ficam os links para a análise a todos os concertos do festival, por dias:
DIA 1: Ignis Fatuus Luna, Irfan, Sol Invictus e Nitzer Ebb
DIA 2: Brainderstörm, Sieben, Rosa Crvx e Suicide Commando
DIA 3: Narsilion, Trobar de Morte, Arcana e Diary Of Dreams
Fora de Palco
Como webzine dedicada essencialmente à música, a análise da Ruído Sonoro centrar-se-á apenas nos concertos, mas é importante referir que o festival teve muito mais além disso. Embora não com tanto impacto, decorreram as seguintes actividades dentro das muralhas do castelo durante os três dias:
—> Exposição Entre Mundos, trabalhos da artista lusa Sílvia Patrício;
—> Projecção do documentário “William S. Burroughs: A Man Within”, com posterior palestra “The Making Of And Other Curiosities” por parte do realizador do mesmo;
—> Palestra “O Absinto e a Cultura Gótica”, pelo espanhol Pedro Ortega;
—> Conferência “Quantas Das Nossas Histórias São Verdades?”, com José Luís Peixoto e Pedro Laginha;
—> Apresentação do segundo volume da BD “As Extraordinárias Aventuras de Dog Mendonça e Pizzaboy: Apocalipse”, por Filipe Melo;
—> Projecção de filmes mudos na Torre de Menagem: Nosferatu, Metropolis e Das Cabinet Des Dr. Caligari;
Notas Finais
O balanço geral do Entremuralhas 2011 foi mais do que positivo, decerto acima das expectativas de todos os presentes. Ficam aqui algumas considerações várias sobre as condições do evento.
Em primeiro lugar, convém referir que o acesso ao castelo não é dos mais apetecíveis. Uma subida imprópria para asmáticos, tanto para chegar às portas do castelo como para movimentações entre os vários palcos, tornaram o festival numa verdadeira maratona para os menos aptos fisicamente. Realizar um evento desta natureza num local como o Castelo de Leiria não é tarefa fácil, mas as condições no geral eram o melhor que se poderia esperar. Havia muito por onde comer e beber dentro das muralhas e as condições sanitárias eram satisfatórias, apenas com um reparo: quem tivesse no topo do castelo no Palco Alma e quisesse ir à casa de banho, tinha uma longa deslocação a fazer, com mais uma subida enorme se quisesse lá voltar.
A zona de comércio era vasta e bastanta variada, indo ao encontro dos mais variados artigos relacionados com a cultura gótica. Era possível encontrar lá itens que de outra forma seriam difíceis de obter no nosso país.
Destaque final para as condições de som, com uma acústica brilhante que ecoou nitidamente nas muralhas e tornou as actuações imaculadas a esse nível. Mais uma edição de absoluto sucesso do Entremuralhas. Cá esperamos pelo ano vindouro!