Fomos conhecer o trabalho da artista leiriense em ascensão, chegada ao público através da plataforma Tradiio. Débora Umbelino, a amável jovem de apenas 21 anos, contou-nos numa esplanada em Lisboa um pouco da sua evolução no mundo da música e falou-nos do seu projecto individual enquanto Surma.
E atenção, vídeo da entrevista disponível no nosso Instagram (@ruidosonoro). Live act no próximo sábado, 7 de Maio, pelas 23h30 no Musicbox, em Lisboa. Entrada gratuita.
Ruído Sonoro: Podes-nos explicar como surgiu Surma, o porquê deste nome e o que representa este projecto para ti?
Débora: Eu tinha uma banda anteriormente, só que acabei por sair e decidi enveredar por um caminho mais a solo. Tens as tuas ideias, metes o que queres, se não queres, tiras. É um bocado mais de liberdade do que teres uma banda por trás. Tens sempre as ideias dos outros e podes não gostar muito disso. O nome de Surma veio através de um documentário que eu estava a ver na altura e ficou-me logo no ouvido e decidi arriscar-me com esse nome. É pequenino, é curtinho e ficou.
RS: Cresceste em Leiria. Como se deu a tua evolução no mundo da música e esta tua ascensão, mais recentemente?
Débora: Sim, sim. Desde miúda que a música sempre esteve muito presente na minha vida. Desde os cinco, seis anos comecei a aprender bateria. Só que meteram-me a aprender flauta e não tem nada a ver. Depois com onze, se não estou em erro, foi com guitarra acústica… mas era clássica e acabei por desistir passados seis meses. O mesmo aconteceu com o piano, passado um ano depois, e depois vim dar ao Hot Club, aqui em Lisboa em contrabaixo e voz, mas desisti passados dois anos. Não me dou muito bem com a teoria, como estás a ver. E pronto, tinha a banda, como já referi anteriormente. Depois desisti da banda também e agora tenho a Surma. Espero não desistir também da Surma. [risos] Foi assim um percurso um bocado atribulado na música.
RS: Mas isso deu para reunires um conjunto de conhecimentos a nível musical…
Débora: Sim, muitas bases e aprendes sempre muita coisa. Conheces sempre muita gente e aprendes muita coisa quando ‘tás em aula e conheces muita malta que está dentro do ramo. É fixe.
RS: Qual foi a tua reacção ao perceber a tua elevada cotação na Tradiio? Foi lá onde surgiste.
Débora: Opá! [risos] Ainda nem acredito, desde o início de Surma ainda nem estou em mim com tudo o que tem acontecido, tem sido mesmo uma coisa louca. Eu nunca pensei que o pessoal apoiasse tanto. Tem sido um apoio bué porreiro. Ainda nem ‘tou… parece que ‘tou num sonho ainda.
RS: É tudo muito recente…
Débora: Ya, é tudo muito recente mesmo. [risos]
RS: Sabemos que a Tradiio te apresentou o convite para ires ao Super Bock Super Rock agora, no Verão. O que é que esperas desse concerto? De que maneira esta noticia teve impacto em ti?
Débora: Até foi a Pipa Marinho que me ligou no dia 1 de Abril, lembro-me bué bem. Até achava que ela estava a gozar com a minha cara, e ela “achas que eu brinco com coisas sérias?”, e foi mesmo brutal! Eu gritei bué, ouviu-se pelo prédio todo, foi bué fixe! Espera-se um concerto diferente do habitual, vou juntar mais duas pessoas comigo, não vou dizer o que é, vai ser diferente. Vai ser giro, vai ser giro.
RS: Íamos perguntar-te se é difícil ser-se músico em Portugal.
Débora: É, é difícil. É difícil viver disto. Porque, às vezes, tens de pagar para tocar e é um bocado… É muito difícil. Dizem que lá fora é mais fácil, mas não sei se é mais fácil se não…
RS: Tens exemplos lá fora, pessoas que conheças?
Débora: Pois, é isso. Tens grandes exemplos lá fora, há bandas grandes, tens The National, sei lá, há muita coisa boa por aí. St. Vincent… talvez esses vinguem na música. Agora coisas mais pequenas não sei, não sei se conseguem.
RS: Surges sozinha neste projecto, one-woman-band, como lhe chamaram, num tempo em que o feminismo ganha espaço no mundo. Como te sentes em relação a esta questão?
Débora: Boa pergunta! Essa ‘tá fixe! Opá, não sei, é muita pressão para cima de ti, isso é. Estás sozinha, fazes tudo. Não sei, tem vantagens e desvantagens. A cena é essa, mas isso é como tudo. Tens desvantagens em carregar o material, sempre sozinha, é um bocado mau. Mas lá está, é muita liberdade, sentes que és tu, és tu própria. Improvisas quando queres, fazes aquilo que queres, mas é uma pressão muito grande em cima de ti, isso é verdade. Não sei, acho que estão a sair coisas a solo muito boas, femininas, as masculinas já estão aí muito fora, há aí muita coisa boa feminina a acontecer, Izzy Bunny, por exemplo, ‘tá a sair também. Há aí muita coisa boa agora.
RS: Comparando com o panorama geral, como é que tu, enquanto mulher, e sozinha, consegues contornar a questão? Em relação a artistas masculinos, que toquem a solo, sentes alguma diferença, mais dificuldade?
Débora: Não, nem é por ser isso. Mas acho que as mulheres, no geral, na música são um bocado postas para trás. Mas acho que isso tem mudado, de ano para ano, acho que isso tem mudado.
RS: E por que achas que isso acontece, ou tem tendência a acontecer?
Débora: Não sei, acho que o pessoal tem aberto mais a mente no que toca a ver mulheres em palco, acho que isso tem evoluído muito de ano para ano. E vê-se, têm-se visto muito projectos a solo de mulheres.
RS: Recorres a diversos instrumentos de som, tanto em estúdio como em palco. O que difere nas actuações ao vivo?
Débora: O que é que difere? Nunca toco nada igual. A cena é essa. Mas o set é sempre igual, sintetizador, baixo, guitarra, é sempre a mesma coisa. Mas, sei lá, posso fazer um riff de guitarra diferente ou de sintetizador, até mesmo a voz. Mudo muita coisa, é sempre à base de improviso. Se fores hoje a um concerto meu, amanhã já é diferente. É um bocado assim.
RS: Onde vais buscar as tuas influências, a tua inspiração?
Débora: Eu ouço muito Annie Clark, St. Vincent. Sou um bocado obcecada por ela. Mas quando vou compor tento abstrair-me de tudo, não ouço nada nesse dia e pronto. Faço aquilo que me vem à cabeça. Quero fazer uma coisa diferente. É um bocado difícil porque já está tudo feito hoje em dia mas tento abstrair-me daquilo que ouço para ver se faço alguma coisa diferente.
RS: Tal como nas outras artes, um dos benefícios da música é esse mesmo, o poder dar asas à imaginação e à criatividade. Portanto, esperamos que não esteja tudo feito e que tenhamos hipótese de ouvir coisas novas da Surma.
Débora: Sim! [risos] É um bocado por aí, tanto que estou a fazer instrumentos novos em casa, à mão. Não sei se vai correr bem, se não… veremos.
RS: Embora se trate de um estilo muito teu, podemos dizer que é uma sonoridade que transmite uma grande carga emocional. O que depositas nas tuas músicas?
Débora: Muito amor! [risos] Não, não… Mas sim, é o que me sai na altura, tem bastante carga emocional. Eu inspiro-me muito no vazio, pode parecer um bocado estúpido. Tem de estar tudo bué silencioso, não se estar a passar nada, que vem qualquer coisa à cabeça. E é aí que acho que vem um bocado da carga emocional que há em mim e que passa para as pessoas.
RS: E sentes que as pessoas também recebem o que tu depositaste na música, ao compor?
Débora: Eu acho que sim, pelo menos pela recepção que tenho recebido, pelos concertos e os elogios que tenho recebido pelo Facebook. Acho que sim, não sei… Acho que sim, acho que chega. E isso é o que eu quero, quero transpô-las para um mundo à parte!
RS: O teu primeiro single, “Maasai”, está a ser muito bem-sucedido, tanto isso que a Society, por exemplo, já o utilizou no vídeo de divulgação da festa…
Débora: Isso é um bocado… [risos]
RS: Como ligas com isto tudo a ocorrer tão rápido?
Débora: Lá está, não sei, eu acho que ainda estou a planar aqui, acho que ganhei um bocado asas, não sei. Tem sido tudo um sonho, uma viagem louca. Até foi o pessoal de lá que disse “podemos usar um bocadinho da tua música? Quanto é que levas?” e eu “não levo nada, tira a música daí, é na boa!”. Tem sido uma viagem muito boa.
RS: E como tem sido andar pelo país a apresentar o teu trabalho? Qual é que é a reacção das pessoas? Já falaste um bocadinho sobre isso…
Débora: Andar na estrada dá-te sempre um grande calo para outras coisas. Conheces muita gente, aprendes a conduzir melhor, o que é fixe [risos], aprendes a montar o set em vinte minutos, o que é também brutal e fazes muitos contactos, isso é muito porreiro. E conheces imensas coisas, já conheci… sei lá, nem sei, já conheci bué gente e bué bares… e estradas novas, é muito fixe!
RS: O que é que podemos esperar no futuro? O que é que tens planeado? Projectos guardados na gaveta, alguma coisa que possas divulgar?
Débora: Sim. O novo single sai em Setembro, só que eu ainda não mexi em nada, não sei como é que isso vai acontecer. E o disco sai no próximo ano, em meados de Fevereiro ou Março. Mas também ainda não comecei a trabalhar nisso, ou seja, também não sei o que é que vai sair. Acho que vai ser mais electrónico do que as músicas que vocês já ouviram, pelo menos é o que me tem saído mas nem eu mesma sei o que vai acontecer.
RS: E qual é a tua opinião sobre colaborações com outros artistas? Estás disponível?
Débora: ‘Tou! Até tenho aqui umas em mente, já. E instrumentos assim um bocado fora do habitual, também.
RS: Estavas a dizer que estás a construir instrumentos em casa…
Débora: Sim, sim! Também por isso, esperem uma coisa assim um bocado estranha. [risos]
RS: E tu, o que é que esperas da parte das pessoas que apreciam e reconhecem o teu trabalho?
Débora: É assim, eu tenho muito medo sempre, por isso é que eu nunca meto quase nada no Facebook. Tenho muito medo da reacção de fora. Espero que tenham uma reacção muito boa, como foi da “Maasai”. Igual ou ainda melhor, espero essa reacção. Mas não sei, veremos.
RS: Mas, talvez, um dos segredos para teres sucesso seja arriscar…
Débora: Sim, isso é verdade. E é o que eu vou fazer neste álbum, por isso é que nem eu mesma sei o que vai acontecer, vou arriscar um bocadinho mais… vamos lá ver!
Entrevista: Ana Margarida Dâmaso