Throes + The Shine: “O mais importante é que os concertos transparecem energia e sinceridade da nossa parte”

A antecipar o concerto de apresentação do novo álbum Wanga, no Lux Frágil, a Ruído Sonoro entrevistou em estúdio dois dos elementos da banda de rockuduro, Throes + The Shine, Igor Domingues e Marco Castro. Respondidas ficaram questões sobre a fundação da banda, a fusão do rock com o kuduro, o ritmo de trabalho com a Discotexas e ainda o que esperar sobre o novo disco, a sair no próximo mês de Maio.

Ruído Sonoro: Deram início ao vosso projecto há alguns anos, juntando o rock e o kuduro, das duas bandas. Querem falar sobre como deram início ao projecto?

Igor Domingues: Aconteceu muito por acaso. Nós [Igor e Marco] éramos os Throes, o Diron e o André eram os The Shine, e por acaso tocámos na mesma noite. Tocámos a abrir para uma banda chamada Fucked Up, que é uma banda canadiana, e a seguir tocavam os The Shine. Os The Shine viram o nosso concerto, acharam piada, algumas das músicas tinham um ritmo já, não me perguntes porquê, já um bocado colado ao groove do kuduro, e eles acharam que podia funcionar fazermos uma participação. Achámos logo a ideia genial porque ia sair algo de diferente de certeza. Depois de termos tido essa ideia de fazer a participação, ficou um bocado em “águas de bacalhau”, até nos voltarmos a comunicar. Quando isso aconteceu, fizemos um vídeo para o Bodyspace que foi bem recebido e convidaram-nos para tocar num festival, que era o Milhões de Festa. Em duas semanas fizemos à volta de oito, nove músicas. Quando acabou o concerto, o concerto correu tão bem que nós decidimos seguir em frente e tomar isto como um projecto a sério e aqui estamos agora.

RS: De que forma é que o apoio da Discotexas, com o Xinobi e o Moullinex, tem sido importante para o vosso crescimento?

Marco Castro: Isto ainda é uma fase muito inicial mas para já nós estamos a adorar trabalhar com a Discotexas. É uma editora um bocadinho diferente da que nós tínhamos antes, que era a Lovers & Lollypops, no sentido em que, em primeiro lugar, é uma editora gerida por músicos: é o projecto do Moullinex e do Xinobi e o facto de eles terem carreiras com um progresso já bastante assinalável, dá-lhes uma experiência de campo e uma noção do que é que os músicos precisam… lá está, eles estão nessa pele, mesmo, para fazerem um projecto crescer e estarem confortáveis nesse processo. Depois mesmo a nível de editora em si, todo o processo de distribuição vai ser muito mais amplo do que acontecia antes. A produtora Discotexas tem parceria com duas distribuidoras major, com a Universal e com a K7 a nível mundial. Isso vai permitir que, pela primeira vez, tenhamos os discos a ser distribuídos fisicamente em vários países. A promoção, pela primeira vez, também se vai estender para fora de Portugal, apesar de nós já tocarmos no estrangeiro regularmente desde 2013, vai ser a primeira vez em que temos uma editora a dar todo este apoio, que é o necessário, mesmo.

RS: Após os dois álbuns que já lançaram, como tem sido a aceitação do público sobre esta nova fusão musical, sendo o rockuduro um novo estilo, talvez inventado por vocês?

Marco: Tem sido sempre bem recebido este género. Acho que o mais importante é que os concertos transparecem energia e sinceridade da nossa parte. Nós estamos ali para nos divertirmos e para fazer com que as pessoas se divirtam e acho que em qualquer concerto em que os músicos transpareçam isso, e tem de ser genuíno, geralmente acaba por ser algo que as pessoas se apercebem muito facilmente. Isso é algo que temos reparado que acontece tanto em Portugal como fora de portas. Por isso, apesar de ser um género que pode soar muito estranho no papel, depois a forma como acontece é bastante natural.

RS: Gostávamos de saber se existe alguma diferença na actuação aqui, em Portugal, e lá fora, sendo que nós estivemos na apresentação do vosso trabalho no Tanque, com o Moullinex, e realmente sim, sente-se toda a energia e o público fica ali todo envolto. Mas nós já temos algum conhecimento do que é o kuduro. Como é que é lá fora?

Marco: A abertura das pessoas é muito grande na mesma, e hoje em dia a globalização também acaba por tornar estas coisas um bocado mais naturais na cabeça das pessoas. A recepção que elas têm, apesar de muitas vezes ser um género que é desconhecido para alguns, outros já o conhecem até porque já temos embaixadores deste tipo de música que são bastante conhecidos, como é o caso do Buraka Som Sistema, por exemplo. E depois lá está, como é uma música bastante enérgica, com um ritmo muito forte, acaba por, em concerto, conseguir contagiar as pessoas.

RS: Sabemos que andaram a passear pela baixa lisboeta, esta semana…

Igor: Foi! (risos)

RS: …Como é que foi a experiência de dar a conhecer a vossa música às pessoas, na rua?

Igor: Acho que começou por ser um bocado assustador porque ‘tás a mostrar a tua música, ou aquilo que tu fazes, a pessoas que não conheces, que não sabes qual é o background delas, não sabes o que é elas gostam ou não gostam. Mas depois de começar, sinceramente, e depois de ver tantas respostas positivas, todo esse medo passou.

Marco: Sim, sim, foi a primeira vez que fizemos isto e foi uma ideia gira que a Antena 3 teve, até. E lá está, apanhámos um bocadinho de tudo. Apanhámos pessoas que disseram logo que não era o género delas, apanhámos outras que disseram que era muito giro, que era uma fusão muito diferente do que já tinham ouvido mas que funcionava, mas a maior parte das respostas foram boas.

Throes + the Shine
© Ricardo Almeida
 

RS: Até ao momento, qual é que consideram, se é que consideram, que foi o vosso ponto de viragem neste projecto, dos Throes + The Shine?

Marco: Acho que a mudança mais drástica aconteceu o ano passado, em vários aspectos. A banda até ao segundo disco foi sempre partilhada com outro tipo de projectos pessoais de cada um, desde estúdio, trabalho, o que fosse… E a passagem de 2014 para 2015 marcou a saída de duas pessoas da banda, não por motivos de zangas ou o que quer que fosse, mas pelo facto de eu, o Igor e o Diron termos decidido que queríamos mesmo levar este projecto além e capitalizar em todos os contactos que já tínhamos, etc. Isso foi logo uma grande mudança, a partir desse momento. O ano passado foi logo o ano em que tivemos mais concertos porque estávamos mais libertos de outras obrigações. Este ano ainda só estamos em Abril mas já temos mais concertos marcados do que no tivemos no ano passado inteiro e, também, depois o próprio concerto foi mais pensado, está tudo mais rico, mais trabalhado porque lá está, quanto mais tempo se dedica a um projecto, melhor ele se torna.

RS: Vocês falam muito da parte da energia. Como é que é o vosso trabalho em estúdio e ao vivo, têm alguma preferência?

Marco: Vai variando um bocadinho. Nós nos dois primeiros álbuns, e nota-se bastante isso, foram álbuns compostos de uma forma que é mais típica de uma banda orgânica, por assim dizer. Aquele line-up clássico, de teres quatro ou cinco pessoas a tocarem juntas numa sala e fazerem a música surgir dessa forma, enquanto este disco não foi tão feito dessa forma, digamos. Ligámo-nos mais às máquinas, por assim dizer, cada um trazia coisas diferentes de casa. Às vezes já músicas completamente estruturadas, outras que eram apenas pedaços de alguma coisa, samples que o Igor trazia ou guitarras, que eu também trazia algumas. Neste álbum também se foi abrindo um bocado horizontes, porque o Igor é o baterista em concerto, mas neste álbum já trouxe coisas que não eram ligadas ao instrumento que ele tocava sempre. A mesma coisa se aplica a mim, também trouxe alguns beats electrónicos e coisas desse género. O Diron, que é vocalista, trouxe também algumas ideias de beats electrónicos.

Igor: Isso foi importante para a diversidade porque se for sempre a mesma pessoa a tocar o mesmo instrumento não é que acabe sempre por ser sempre a mesma coisa mas nota-se ali o cunho pessoal, e se for outra pessoa a pegar naquilo, dá outro toque, tem outras ideias.

Marco: Cada um tem o seu estilo, as suas influências. E o facto de estares a libertar o que normalmente é o teu trabalho para outra pessoa explorar, se calhar acabas por criar coisas bastante diferentes e ouvindo este álbum nota-se muito isso. Também todo o processo de gravação foi diferente. Estávamos habituados a gravar num estúdio mais ligado ao rock, este álbum foi gravado com Moullinex, aqui onde estamos sentados e numas salas que tem ali, e o background que o Moullinex tem é muito mais ligado à música de dança, de composição ligada a computador e tudo mais. E isso também levou a que usássemos outro tipo de instrumentos e fizéssemos as coisas de uma forma muito diferente.

Igor: E os convidados, também…

RS: Sabemos que contam com Da Chick…

Igor: Nós no álbum temos quatro convidados, para além do Moullinex estar a produzir todo o álbum em conjunto connosco. Temos quatro convidados que tocam connosco em quatro músicas diferentes. Temos a Da Chick, temos os Meridian Brothers, que são uma banda da Colômbia, temos a La Yegros, que é uma vocalista de Buenos Aires, e temos o Pierre Kwenders que é o que está no primeiro single, que é um músico do Congo que neste momento vive no Canadá. Isto foram tudo pessoas que fomos conhecendo em tours, de alguma forma. Foi assim o processo de colaboração.

RS: O vosso álbum sai no próximo mês. Assim, resumidamente, o que é que as pessoas podem esperar?

Marco: Deste álbum podem esperar um álbum bastante mais trabalhado do que os anteriores, bastante mais variado mesmo. Nesse aspecto nem se compara. A nossa música mais lenta está neste álbum. A nossa música mais rápida também está neste álbum. Tem um espectro de dinâmica muito maior do que os outros. E lá está, neste momento nós sentimos que é o álbum que melhor representa a visão que nós temos para este projecto, que é não se cingir só aquela primeira ideia do rockuduro e de ser o kuduro misturado com rock, mas sim um projecto livre e de fusão de culturas e de géneros musicais, que sejam muito diferentes uns dos outros e encontrar um meio-termo que funcione.

Entrevista: Ana Margarida Dâmaso