Entrevista a Caroline Traitler

Caroline TraitlerÉ comum encontrar entrevistas às mais diversas bandas e artistas singulares, mas o mundo do espectáculo depende de outros intervenientes na sua divulgação. Os repórteres credenciados, tanto a nível textual como fotográfico, têm a tarefa de concretizar e imortalizar as memórias de quem presenciou determinado concerto. Actualmente localizada em Viena, a sua cidade natal, Caroline Traitler é responsável por muitas daquelas fotografias fantásticas que encontramos das nossas bandas favoritas na internet. Nascida a 14 de Junho de 1978 e com mais de uma década de experiência na reportagem de eventos musicais (com grande tendência para a cena pesada), Caroline desenvolveu uma pós-produção fotográfica única, elevando os seus disparos a um patamar de qualidade inconfundível. Numa entrevista rara, a própria contou-nos sobre as suas viagens pela Europa, as suas preferências musicais e deixou ainda uma mensagem aos futuros fotógrafos de concertos, não deixando de recordar a sua única passagem por Portugal até à data.

Ruído Sonoro: Antes de mais, obrigado pela oportunidade de entrevista. Como e quando começou o interesse pela fotografia?
Caroline Trailer: Obrigada eu pelo interesse. Eu sempre gostei de fotografia e aprendi imenso com o meu pai quando era mais nova. Quando entrei nos meus estudos jornalísticos, em 2000, tive aulas de fotografia também e aprendi tudo do zero, em equipamento analógico, e foi assim que começaram os disparos.

Steven Wilson

RS: Ainda que aprecies fotografia em geral, é seguro afirmar que existe uma tendência especial para a área da música? O que te fez começar a fotografar concertos? Há quanto tempo tal acontece?
CT: Sim, a fotografia relacionada com música é onde mais me foco, mas também faço muito outros tipos de fotografia, como é óbvio. Não gosto de me limitar a um campo único e também preciso sempre de inspiração de outros motivos. Tive a minha primeira experiência num photopit em 2001 quando um amigo meu que trabalhava para uma revista adoeceu e me pediu para cobrir o concerto de Paradise Lost no seu lugar. Claro que aceitei e gostei de tal maneira que decidi investir no ramo do fotografia de concertos. Era um pouco mais complicado na altura tendo em conta que não existia a tecnologia digital dos dias de hoje, mas ainda assim foi uma óptima maneira de aprender em focar-me no que era realmente essencial e a concentrar-me na composição de uma imagem. Este ano atinjo o meu 12º a fazê-lo e ainda não me sinto farta.

RS: Que passos tomaste para obter o teu próprio estilo? Tinhas no passado alguma referência ou algum fotógrafo com o qual aprendeste e seguiste?
CT: Na verdade nunca segui o estilo de pós-produção de nenhum fotógrafo, sempre tentei desenvolver o meu próprio sem ser demasiado influenciada. Mas é claro que tive alguns fotógrafos a ajudarem e a inspirarem-me imenso quando comecei – a grande maioria trabalhava para grandes revistas na altura (e provavelmente ainda o fazem). Um fotógrafo que admiro imenso é Axel Jusseit da Rock Hard alemã que sempre ajudou e continua a fazer bom trabalho.

RS: Tanto quanto sei viajas imenso. Em que cidades te focas mais?
CT: Eu adoro viajar e é algo que faço ainda antes de ter começado a fotografar. É uma boa maneira de me desenvolver, ver novas coisas, obter novas inspirações e, em geral, novos caminhos para mim e para o meu trabalho. Não há uma cidade onde me foque mais, prefiro ver o mais possível do mundo e estou muito contente por ter concretizado um sonho no ano passado ao visitar a Austrália, onde tive a oportunidade de trabalhar com duas bandas fantásticas: The Eternal e Lycanthia.

RS: Existe algum país europeu em que gostasses de te estrear?
CT: No ano passado tive a oportunidade fazer as primeiras fotos em território búlgaro no concerto em que os Anathema gravaram o seu DVD, em Plovdiv, e recebi excelente feedback de lá. Ainda há alguns sítios na Europa que gostava de visitar e fotografar em concertos, como a Islândia – outra viagem de sonho para cumprir – ou a Roménia. Gostava também de ir ao Círculo Polar fotografar as luzes do norte… Mas para ser honesta, já estive em quase todos os países europeus.

Moonspell

RS: Esta pergunta é um pouco cliché, mas qual é a tua relação com Portugal? Guardas amigos e boas memórias daqui?
CT: Eu adoro Portugal! Estive pela primeira vez, e infelizmente a única até agora, em 2011 para o Vagos Open Air e fiquei maravilhada com a beleza do país e com a gentileza das pessoas. O festival também foi bom e fiz muitos amigos aí, quero mesmo voltar!

RS: Menos viagens e mais música. O que te agrada mais – fotografar festivais ou concertos fechados?
CT: Na verdade depende imenso das bandas que estiverem a tocar. Eu gosto principalmente de fotografar quem já conheço há algum tempo e que são amigos, pois assim existe uma maior relação pessoal, mais sentimentos e inspiração.

RS: Que estilos mais ouves? Existem bandas de que sejas mesmo muito fã?
CT: Gosto principalmente de art rock, doom, dark metal, prog, avant-garde metal e um pouco de black metal agora e, claro, também muito não-metal como música clássica. A música e a arte, em geral, são as essências da minha vida. Algumas das minhas bandas favoritas são Anathema, Katatonia, The Cure, etc… demasiadas para mencionar aqui.

RS: Suponho que existam algumas especiais com as quais tenhas trabalhado. Consegues mencionar algumas? E que diferenças existem entre essas e outras?
CT: A banda com quem já trabalhei mais foram os Anathema e foi sempre uma experiência espectacular. Mas também já fiz muito trabalho fotógrafo com Primordial e Dornenreich. Como mencionei anteriormente, quando fotografo uma banda que já conheço há algum tempo e que consegui desenvolver uma certa amizade devido ao trabalho, torna-se mais fácil de as fotografar e deixa-me mais inspirada sabendo que tipo de fotos a banda gosta.

Anathema

RS: Conta-nos um pouco sobre a tua ligação com os Anathema. Como é que aconteceu?
CT: A primeira vez que entrei em contacto com os Anathema foi na altura dos fóruns, em 2002, penso eu. Fui a muitos dos seus concertos em 2003 e 2004 e no concerto em Munique, no início de 2004, questionaram-me se lhes podia tirar uma fotografia para o DVD “Were You There?” e assim o fiz. Penso que foi o início de uma amizade e de uma cooperação duradouras e de alguma maneira tudo correu bem desde então. Continuo muito agradecida e contente por cada momento em que trabalhamos juntos.


RS: A melhor experiência ao vivo até ao momento?

CT: De certeza o concerto de Anathema em Plovdiv, por vários motivos.

RS: A pior experiência ao vivo? Uma história de pavor ou algo nesse sentido…
CT: Nem por isso. Pode sempre acontecer eu não gostar de uma banda ou mais num festival grande ou em digressões, mas geralmente vou-me embora quando isso acontece ou acabo no bar e falo com amigos. Penso que a única experiência realmente desagradável foi num festival em que estava a tocar uma banda de black metal (nem me consigo lembrar do nome) e o vocalista atirou vinho a partir do palco e caiu na minha máquina nova… foi um pouco irritante, mas nada de mais aconteceu e a máquina ficou boa.

RS: Sentes que as pessoas percebem aquilo que tentas transmitir nas tuas fotografias?
CT: Eu espero que sim… nunca irás saber se as pessoas compreendem a tua arte. Alguns podem amá-la, outros podem odiá-la, mas isto é algo que qualquer pessoa a trabalhar no ramo tem que lidar e aceitar.

RS: Que banda, do passado ou do presente, gostarias de fotografar mas que nunca tiveste a oportunidade?
CT: Sem dúvidas, os The Cure. Morreria para lhes tirar fotografias um dia!

RS: Para terminar, gostarias de deixar algumas palavras para os futuros fotógrafos de concertos?
CT: Sigam o vosso caminho, concentrem-se no vosso trabalho e não se exibam do vosso bom equipamento, nem copiem algo que alguém já faz.

// Nuno Bernardo