Colour Haze no Hard Club. Um concerto que teima em não se desvanecer da memória

O primeiro concerto de Colour Haze em nome próprio por terras lusitanas teve a escolta dos TAU, seus compatriotas, e Jesus The Snake. Uma noite com tudo o que esperávamos e mais, no Hard Club, no Porto, no passado dia 19 de Maio.

A iniciar a noite estiveram os portugueses Jesus The Snake, com o seu som descontraído e viajante. Talvez um pouco inibidos de início, vinham empenhados em levar-nos com eles numa viagem instrumental pelo deserto, e a verdade é que a dose bem servida de fuzz que traziam consigo nos conquistou em pouco tempo. Teclas são geralmente um bom complemento neste género de música, e o responsável por elas estava tão concentrado na sua missão de nos levar às mais longínquas e fascinantes paisagens sonoras que se tornava realmente cativante de ver.

 

Devidamente contagiados pelas vibes do quarteto, concentramo-nos frente ao palco, expectantes pelo concerto que se seguiria. E que surpresa foi. O gosto de TAU pelo uso de várias influências étnicas salta à vista assim que se apresentam em palco. Um amigo comentava que o líder da banda parecia «o Charles Manson, mas em bom», observação estranhamente acertada. Para além de uma certa semelhança física, o vocalista e guitarrista, como qualquer cult leader que se preze, estabeleceu desde logo relação com o público, criando um sentimento de pertença e coesão para em seguida nos doutrinar à adoração da natureza através daqueles sons místicos emitidos com o auxílio de shakers e tambores tribais. Os cânticos repetitivos colocavam-nos num estado de transe em que nos sentíamos inexplicavelmente bem e do qual não apetecia sair nunca mais. O feitiço do folk psicadélico perdurou ainda uns momentos após o fim do concerto, apenas interrompido pelo concerto da banda da noite, Colour Haze, mas ainda hoje, volvidos alguns dias, temos “Mother” a entoar na nossa cabeça independentemente da nossa vontade.

 

O concerto do trio – agora quarteto, com a inclusão do teclista Jan Faszbender a acrescentar um brilho particular às composições – durou qualquer coisa como duas horas, mas nem por um momento sentimos cansaço. A música de Colour Haze é uma divagação colectiva em que cada voz complementa o conjunto perfeitamente, um monólogo semi-improvisado cheio de pontuação, linguagem rica e a fluidez de quem já domina esta conversa, da qual sorvemos cada palavra, meros espectadores embevecidos. Houve um bom equilíbrio entre o revisitar de álbuns mais antigos e as músicas do último In Her Garden: o público responde com verdadeiro entusiasmo a malhas recentes e orelhudas como “Skydancer”, mas sem dúvida – e sem surpresa – que as reacções mais calorosas foram para canções já com um certo “estatuto” junto dos fãs, como “Aquamaria”, “She Said” ou “Tempel” – esta última deixada quase para o final do concerto, porque a banda sabe que o melhor se guarda para último.

O público não os deixava ir embora, obviamente, sem insistir no encore, pelo que voltaram para mais duas músicas. Como se a deliciosa obscuridade de “House of Rushammon” já não nos tivesse deixados suficientemente emotivos, ainda tivemos direito à tão desejada “Love”, que tornou o estado de espírito na sala quase palpável; a cada palavra um arrepio, neste hino que faz especialmente sentido na época que vivemos. Um final absolutamente arrebatador para um concerto que teima em não se desvanecer da memória.

Texto: Joana Ribeiro
Fotografia: Carolina Neves