O luminoso Nighthawks, de Edward Hopper, não ilustra este texto por acaso. O mestre da pintura norte-americana conseguia transformar momentos de aparente isolamento numa presença permanente. A banda britânica realiza essa sensação em música. A sua prestação ao vivo concretiza-a com uma imensa nitidez.
A substância do concerto foi em grande parte o último álbum, The Waiting Room, transportando para o palco os seus arranjos e produção coloridos. A sala Suggia da Casa da Música, no Porto, estava praticamente esgotada, com a média de idades – à volta dos 40 anos – a indicar um público que acompanhou os 25 anos da banda. Talvez por isso sabiam para o que vinham, mas talvez não: um date particular.

Stuart Staples mal fala com o público, só agradece e dialoga um pouco antes do encore. Os próprios músicos interagiam muito pouco entre si. Nos momentos mais calados mas ainda assim ritmados ouviasse a voz e guitarra do vocalista ao mesmo tempo que o pé de alguém a bater na plateia, e fazia sentido.
Entenda-se que os Tindersticks fazem uma subversão malandra do conceito de concerto: esta música despe-se de espectacularidade também ao vivo, deixando o público à vontade, liberto do protocolo de receptor. Havia pessoas encostadas às cabeças vizinhas, outras de olhos fechados, outras marcando o tempo. Todas foram convidadas a permanecer num espaço de suavidade, brilhantemente criado pela bandas e pelos técnicos de som (é possível, mas dificilmente saberão o que é um som ao vivo fabuloso sem terem ido a um concerto dos Tindersticks), e a interagirem com ele. O concerto é um recreio perante as suas letras abandonadas e instrumentação delicada.
Se calhar, a ausência de comunicação e o movimento lento consistiam na performance: o único objectivo é o de nos transportar para o tal bar, sozinhos, bebendo, à espera, singulares como as nossas intenções humanas. Assim sendo, acertaram em cheio.
Texto: Gonçalo Tavares
Fotografia ilustrativa de Matthias De Ridder