A 13ª edição do festival Moita Metal Fest trouxe de novo à habitual Sociedade Filarmónica Estrela Moitense as sonoridades mais pesadas que se produzem na cena underground da nossa nação, nunca esquecendo no entanto, nomes grandes do mesmo espectro lá de fora, como Tankard e Entombed A.D nem registos que divergem do «tradicionalismo metaleiro» como Don’t Disturb My Circles e The Parkinsons.
Com promessa de festa animada, cerveja, e muita música o festival teve inicio na sexta-feira por volta das 20h30 com os jovens Hotkin e o seu hard rock que foi eficaz a introduzir os madrugadores na atmosfera de festa, sabendo que a partir dessa altura seria sempre a subir de intensidade. A banda Sunya deu seguimento ao line-up com um metal relativamente tradicional, mas com o toque de uma voz feminina, talvez demasiado familiar para quem conhece Lacuna Coil, Within Temptation, etc..
A seguinte banda, semelhante à anterior apenas no género dos seus integrantes, foi Neoplasmah que proporcionaram um excelente concerto, tanto musicalmente como em termos de dinamismo em palco – e até no aspecto visual com o uso de interessantes máscaras e adereços. Os abundantes blastbeats com melodias interessantes encafuadas nos interstícios da música foram intensos e eficazes, graças talvez à excelente qualidade do som transmitido a partir das colunas da SFEM. Os seguintes a pisar o palco foram For the Glory, uma banda de estatuto já quase residente do festival moitense de tão bem que já conhece este palco. Estes não se coibiram de debitar do hardcore mais despretensioso que é feito por cá, o chamado tugastyle. Trata-se de um espectáculo de animação garantida, com muitos saltos e chapéus com a pala para trás que não desiludiu em edições passadas e tão pouco na de 2016. Sangue e suor… um “Survival of the Fittest”.
É hora de um momento antecipado por muitos: a actuação dos anfitriões Switchtense, que puderam mostrar o seu novo trabalho Flesh & Bones, oferecido em formato físico a todos os que tinham ingresso para o festival. Foi um concerto energético e intenso do início ao fim ao qual os seguidores desta banda, que já dispensa apresentações, estão habituados. O entusiasmo sente-se na sala, mais perto do palco onde os mais corajosos se rendem à energia da música e voam pelo ar e mais longe onde os mais descontraídos tomam atenção ao que se passa em palco. Missão cumprida.
Para fechar o dia actuaram os veteranos Entombed A.D, que partilharam o seu espírito e experiência que adquiriram nos seus (muitos) anos de vida enquanto Entombed, especialmente o icónico vocalista L-G Petrov. Proporcionaram um concerto exímio mas que conseguiu, porém, ser tão caótico e agressivo como terá sido nos dias de Left Hand Path. As pulsações de death metal que a banda produziu fizeram-se ecoar pela sala inteira e redondezas, acompanhadas lírica e fisicamente pelos fãs trouxeram um sentimento de nostalgia para os conhecedores do movimento incubador e época áurea do death metal sueco. Percorreram um pouco da sua discografia inicial e ainda conseguiram encaixar um encore de duas faixas, uma delas uma versão de “In League With Satan” dos Venom. “Wolverine Blues” e “Left Hand Path” não foram esquecidas, e ainda bem.
Com algumas ressacas por curar e uma vontade incontrolável de ficar pela cama com a ameaça de chuva, os mais fieis ao festival compareceram logo após a hora de almoço para começar o seu dia em peso com a actuação de Mindtaker, banda que carrega thrash metal das planícies alentejanas.
Uns chuviscos lá fora por esta altura não conseguiram sabotar a festa, que continuou pela tarde com algumas surpresas como Don’t Disturb My Circles, que conseguiram jogar com o seu nome neste cartaz: perturbar positivamente o circulo que é o habitual alinhamento deste festival com a sua (difícil de rotular) música, concretizada de forma errática e, através de pequenos espasmos sonoros que apesar de de provocar um desconforto inicial, rapidamente a audiência percebeu que estava perante um registo diferente que trouxe ao festival uma lufada de ar fresco. Voltando às sonoridades mais tradicionais, pudemos experienciar Martelo Negro, que nos trouxeram um pouco de negrume e sujidade com o seu thrash metal com temas líricos frequentemente associados ao black metal, numa ode à língua portuguesa, o que também é algo de valor no contexto de tantas bandas que não resistem às tentações das letras anglo-saxónicas.
Na continuação da tarde, enquanto se construía apetite para uma bifana, ou até mais uma jola ou duas, houve espaço para actuações como Ho Chi Minh, que com uma sonoridade equilibrada entre a dinâmica de uns Linkin Park e os rasgos industriais de uns Static-X , falhou em surpreender, mas sucedeu em agradar aos seus seguidores de longa-data que puderam seguir com atenção os vocais. Deu-se um seguimento de bandas já com estatuto quasi-residente, marcando presença já em bastantes edições do festival – são estes os renascidos Grankapo, gigantes do hardcore português, o death metal repetente de Dementia 13 e os Web com o seu heavy/thrash padronizado, que apesar dos anos, não falha em corresponder às expectativas. Espaço ainda para a estreia de Hills Have Eyes, que nos apresentaram o seu metalcore capaz. E como é comum nestes géneros “core” é serem isso mesmo, ou seja, não é possível ter um gosto mediano pela banda e pelo seu núcleo musical – ou se gosta muito ou nem se pode ver à frente – no entanto, objectividades postas de parte o concerto foi dinâmico e suficientemente interessante para se encaixar no contexto do festival.
Após uma curta pausa para jantar foi de barrigas cheias de bifanas entremeadas “gourmet”, e expectativa de um resto de noite em cheio, que começaram a chegar as bandas maiores do dia. A actuar após o crust potente e competente de Simbiose, foram os espanhóis Haemorrhage que nos deram uma figurativa carga de porrada com o seu grindcore/death metal palpitante, destruidor e ensanguentado, que proporcionou moshpits de forte intensidade, com as graças comuns de uma descarga de grind. Os nacionais The Parkinsons romperam com ritmo mais metal para uma lição de punk à anos 70 e tipicamente britânico, não tivessem eles cimentado grande parte da sua carreira em Londres. Continua a ser incrível como os anos passam e Afonso e Torpedo mantêm a sua genica invulgar e espontânea, surgindo o segundo até uns minutos completamente nu como nas velhas histórias da banda. Pedro Chau continua a ser a figura sóbria no baixo, ganchando os ritmos com a baterista Paula Nozzari, permitindo ao quarteto voar tão alto como o palco do Moita Metal Fest permitia. É difícil saírem de um recinto sem o título de «concerto do festival», especialmente depois do caos de “Bedsit City”, “Nothing to Lose” e “So Lonely”.
Para fechar o alinhamento, uma das grandes expectativas do festival: os Tankard, confirmados desde pouco depois do término da edição de 2015 e com tempo de sobra para acumular entusiasmo, traduzindo-se este numa enorme festa com bonecas insufláveis a voar sob as cabeças, cervejas e outros objectos igualmente interessantes e peculiares. No entanto o comportamento dos alemães em palco talvez não fosse o esperado de uma banda frequentemente associada a festa, bebida e afins, pois o vocalista Andreas Geremias, sempre que um objecto ocasionalmente surgia em palco era de imediato posto de lado, cortando um pouco as festividades. Porém os fãs, portugueses como são não se deixaram desmotivar e continuaram a festa em igual intensidade e diversão. Como sempre foi, é e continuará a ser durante um Moita Metal Fest de casa cheia.
Fotografia: Diogo Oliveira
Texto: Ricardo Silva