A pop segundo o estilo inconfundível de Zola Jesus

 

1 de Novembro – Maus Hábitos, Porto

 

Uma noite calma de domingo, no espaço Maus Hábitos, onde o povo se dirigia para assistir àquilo que se tornaria, acima de uma actuação musical, uma performance. Assim se pode designar o concerto de Zola Jesus, naquele que foi um dos concertos mais controversos, a título pessoal. Em termos de choque visual e da imagem que eles transmitiam comparado com a banda sonora a ser ensaiada à nossa frente, pois definiam-se pelas vestes negras, algo que já nos acompanha nas marcações agendadas pela Ampiflicasom – o ambiente musical pop e de sons que estamos habituados a ouvir numa rádio mais comercial, contrastante com os constantes movimentos de um lado ao outro do palco e os saltos e os “auto-abraços” que se reproduziam naquilo que seria mais uma imagem de sofrimento do que propriamente algo ligado à cultura anteriormente referida.

Denotava-se uma maior harmonia entre a aparência e a música quando Zola Jesus se apresentava numa vertente vocal mais soul, coincidindo tudo de maneira matemática, pensado e sentido do início ao fim. O habitual discurso de carinho para com a cidade anfitriã dos eventos da organização do Amplifest também se fez notar e com um certo timbre de especial afecto. Não querendo deixar de parte aquilo que a fez vir ao nosso país, Zola Jesus entrou em contacto com o público à sua frente, naquilo que se tornou numa roda à volta da cantora, como que a pregar “Set Me Free”, onde mais tarde viria a dar mais um discurso de agradecimento, mostrando uma verdadeira ligação com a Invicta.

De forma energética se ia desenrolando o concerto já antes desta interacção com o público e rapidamente já só se conseguia dançar até ao momento em que a cantora se pôs a correr por dentro do público de modo a contactar com todos o mais possível. Foi um concerto como se quer para o dia que foi. Domingo à noite, com os “familiares” e amigos a partilhar um bom momento de cultura, diferente daquilo a que fomos habituados, mas de maneira igualmente interessante.

Fotografia: Carolina Neves
Texto: Artur Basto

 

3 de Novembro – Musicbox, Lisboa

 

A espera foi longa, e passados 3 anos Zola Jesus voltou a pisar as terras lusitanas, desta vez com o mais recente álbum Taiga. A palavra portuguesa saudade é bem conhecida por Nika, pois esta galardoou-nos com um concerto que conseguiu explorar a sensibilidade das melodias por ela criadas – juntou emoções distintas num só espaço, a melancolia com a explosão de energia derivada às sensações mais obscuras que só Zola sabe transmitir.

As opiniões dividiram-se perante o álbum Taiga. A mudança de registo de Zola para um som mais pop despertou algumas reclamações, no entanto Zola afirmou neste concerto que a sua essência prevalece, somente o seu som evoluiu um paradigma mais actual. Confirmou-se que a pop criada em Taiga alcançou mais massas quando vimos uma sala quase lotada.

Zola deu início ao seu ritual fazendo uma vénia às paredes do Musicbox. Deu-se voz à primeira faixa, “Taiga”, de uma forma magistral, e, quando menos esperávamos, houve uma explosão violenta da sua expressão corporal, correndo o palco de um lado ao outro, várias vezes. Zola presenciou-se. A música mais pop do álbum foi recebida com uns valentes passos de dança pelo público. Afinal, “Dangerous Days” cumpriu o seu objectivo de tornar-se o hino pop à maneira da Zola. Seguidamente foi “Dust” onde começou por realçar a sua sensualidade misteriosa e terminou com uma euforia desmedida.

Houve uma pausa de Taiga quando “In Your Nature” ecoou na sala, conseguindo agitar mais o público fã da “antiga Zola”. “Hunger” iluminou a sala em tons quentes transmitindo toda a sua força e vontade de viver e este foi o momento em que gritos de gladiadora se misturaram com sons de trombone, criando um momento muito interessante. Seguiram-se “Go (Blank Sea)” e “Sea Talk”, revelando todo o seu melodrama na voz. Viu-se a sua clara paixão pelo que faz em toda a envolvente da sua performance, antes de avistarmos uma Zola atrapalhada pela sua comovência enquanto estava erguida numa coluna, que viu suceder um interessante tema intitulado por “Lawless”, para serem libertadas algumas dark vibes caracteristicas do alter-ego de Nika.

Aproveitou uma pequena pausa para docemente ajeitar o seu longo cabelo e por de parte o microfone. Cantou em plenos pulmões o inicio de “Nail” e apostamos que toda a sala conseguiu ouvi-la, enquanto desaparecia e reaparecia na penumbra. Foi dos momentos mais mágicos da noite onde definitivamente confirmou-se a maravilhosa cantora que Zola é. “Long Way Down” e “Hollow” voltaram a chamar os trombones e esta última teve direito a um salto do palco para o púbico, onde Zola cantou e encantou dançando as típicas batidas eletrónicas e negras, desta vez com um cheirinho de dubstep à mistura.

As última faixas visitaram os trabalhos mais antigos. Recordou-se Stridulum com a esperada “Night” e depois do encore apareceu finalmente o álbum Conatus, e, numa versão mais intimista, é interpretada a lindíssima “Skin”. Fechou-se com “Vessel”, acompanhada por uma transe de luzes e uma fúria enorme descarregada num prato de bateria. Se pensam que se cansou, desenganem-se. Abandonou o palco mas a vontade de voltar foi nítida.

Um concerto de muita emoção que comprova as habilidades vocais e de performance de Zola. Não houve espaço para aborrecimento – quando menos se espera ela volta do seu mundo transcendente e rebenta o palco com toda a sua energia. Taiga pode realmente entrar no mundo pop, mas é definitivamente uma pop de outro nível com todo o estilo inconfundível de Zola Jesus.

Fotografia: Nuno Bernardo
Texto: Ana Rodrigues