Mucho Flow. “Mucho” Power à conquista de Guimarães

No melhor sentido possível, o Mucho Flow nunca chega a parecer um festival. Tanto pelas ruas estreitas e centenárias que lá nos levam sem pressa, como pelas marcas que a sala guarda de outros tempos bem mais industrializados, a coisa certamente que não se alimenta de artifícios, existindo numa dimensão e escala perfeitas para que a música se mostre mais importante que tudo o resto. Estivemos lá para a quarta edição de um festival que de ano para ano tem vindo a crescer de forma assertiva no norte de Portugal, e que pode muito bem ter vivido em 2016 o seu momento de mais forte afirmação.

À excepção do que (não) fez Nite Jewel, não podemos afirmar que tenhamos visto algum mau concerto. A bizarrice sónica dos Bo Ningen não é para todos mas é bem mais que competente. O mesmo sobre competência podendo ser dito sobre uns Memória de Peixe; iguais a si próprios no que passou pela apresentação de Himiko Cloud, novo disco que verá a luz do dia durante este mesmíssimo mês de Outubro. Já os Naked foram provavelmente a melhor surpresa da noite, com o jovem duo a mover-se de forma esquiva e misteriosa sobretudo pela intensidade da industrial e do noise mas também pela subtileza da r&b contemporânea.

Depois de em 2013 ter tido o descrédito de por cá passar para duas salas cheias como abertura para Sigur Rós, desta feita Benjamin Power (Blanck Mass) regressou mais sozinho do que nunca e brilhou mais forte e mais alto do que qualquer outro nome que ficou para trás. Com camas de rumor animalesco e tomando brocas de dentista para dentadura, o britânico partiu para um violentíssimo assalto aos tímpanos e sentidos dos que por lá pararam hipnotizados. Afinal, Power é daqueles que sabe tudo sobre congelar o tempo;  sobre elevar uma sala ao estatuto de capela por entre nuvens de ruído branco e éter no lugar de água de benta. Algo menos que tremendo seria redutor.

Com cartazes de qualidade e quantidade crescentes, o Mucho Flow parece ter efectivamente encontrado em Guimarães e no CAAA um lugar onde maturar e desenvolver-se à margem de um grande centro, sendo felizmente mais um a mostrar de forma vincada que há mercado para este tipo de aposta.

Texto: Rui P. Andrade