Bizarra Locomotiva @ Beat Club, 30/5/2015

No passado sábado dia 30 de Maio, no Beat Club em Leiria, a habitual estação de boa música denominada Unknown Pleasure Nights recebeu uma Bizarra Locomotiva. Materializada em palco num quarteto explosivo, alimentado pelas almas negras como carvão dos tempos que correm, a locomotiva seguiu a todo o vapor do princípio ao fim, apresentando o seu mais recente trabalho, Mortuário.

Ao contrário dos últimos concertos que tinha visto de Bizarra Locomotiva, Rui Sidónio não começou arrastando a sua caixa de Pandora para palco, talvez por estar sob efeito da Febre de Ícaro. A abertura do novo álbum deu assim inicio ao ritual industrial, perante uma casa cheia, que se deliciou com o visceral som da distorção de guitarra e voz, pautado por uma bateria incansável e polvilhado de sons eletrónicos.

Findo o Mortuário, tema título do trabalho em cartaz, a banda enveredou por clássicos como Egodescentralizado e Gatos do Asfalto. Nesta altura já o Rui era uma fonte, jorrando água e com um aspeto de um Desgraçado de Bordo. A primeira pausa para respirar veio ao sexto tema, com o início sussurrado e sombrio de Foges-me Em Chamas, que não tardou a incendiar o público com o seu refrão demolidor.

Que Segredos Ferrugentos guardará Rui Sidónio para ter tamanha energia e presença singular em palco? Deambulando pelo palco, pelo público, no chão ou agarrado às paredes; enfim, por todo o lado, vomitando delicias líricas com tal intensidade que relega para segundo plano os não menos espetaculares músicos que o acompanham, cada um como que um Fantasma sob controlo do demónio que, como qualquer ser diabólico que se preze, denunciava a falsidade da religião em Grifos de Deus.

A voz infernal continuou com Candelabro Do Amor, começando por confessar que “a luz ofusca-me sempre”; quem não deve ter esse problema é o guitarrista Miguel Fonseca, escondido atrás de uma negra máscara de rosto completa, qual proteção contra a peste. Dedilhando a guitarra com fervor, era acompanhado com igual intensidade pelas teclas de Ricardo “Alpha” Rodrigues, que deram aquela atmosfera fantasmagórica a Engodo e o toque industrial ao Cavalo Alado.

O cenário era completo por Rui Berton, cuja destreza na bateria foi bem demonstrada na doentia Na Ferida Um Verme. Mas como nem só de instrumentos e voz vive uma banda, eis que um dos seus roadies sobe também a palco, com vestes negras de padre e segurando uma Bíblia Sagrada, na qual se lia um Sudário De Escamas, que Rui Sidónio gritou aos ouvidos da impávida e serena figura sacerdotal.

Com a máquina perfeita denominada Escaravelho, a banda despediu-se temporariamente, voltando depois para um encore com Homem Máquina, Apêndices e, para um final absolutamente explosivo, O Anjo Exilado, a renegação total. Com um espetáculo singular, intenso e deixando sempre tudo em palco, é seguro afirmar que os Bizarra Locomotiva são das bandas com melhor presença ao vivo em Portugal e no mundo.

Fotografia: Marina Silva
Texto: David Matos

Setlist de Bizarra Locomotiva